Começa a desmoronar a principal tese da defesa do presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), de que não controlava as contas na Suíça e, por isso, não mentiu à CPI da Petrobras.
Segundo O Globo, em meio aos documentos enviados ao Brasil pelo Ministério Público da Suíça e incluídos no inquérito aberto no Supremo Tribunal Federal (STF) para investigar os crimes de lavagem de dinheiro e corrupção supostamente cometidos por Cunha, uma procuração desmonta a alegação do deputado.
De acordo com a procuração, Cunha tinha amplos poderes para, com os recursos depositados em conta no banco Merrill Lynch, fazer aplicações financeiras em fundos e no mercado futuro, e ainda fazer investimentos de curto prazo, comprar e vender títulos, moedas e até metais preciosos. Só não podia sacar o dinheiro da conta.
Cunha sustenta que não era dono das contas, não podia movimentá-las e que o banco nem o reconhecia como tendo algum direito em relação aos ativos depositados. Tudo porque as contas eram oficialmente operadas por trusts (empresas constituídas para administrar ativos de pessoas físicas e jurídicas). O documento, do dia 10 de junho de 2008, é assinado por um representante legal da trust Orion SP. Ela detinha a conta no Merrill Lynch da Suíça. Os ativos depositados nessa conta eram de Cunha, mas ele alega ser apenas um beneficiário, sem qualquer ingerência sobre os ativos. A procuração, assinada pelo representante da Orion, estabelece Cunha como procurador junto ao Merrill Lynch para fazer investimentos, o que contraria a versão do deputado.
Diz o texto: “O procurador é/está autorizado a comprar e vender todos os tipos de valores mobiliários, títulos de crédito, moedas, metais preciosos, veículos de investimento (fundos), em dinheiro ou outra modalidade, para fazer investimentos de curto prazo em caráter fiduciário, sob risco exclusivo do Principal, em qualquer país e em qualquer moeda, para realizar quaisquer transações abrangidas nos mercado de opções e futuro (quaisquer outros tipos de transações nos mercados de opções e futuro só podem ser realizadas se uma autorização específica é assinada)”.
Cunha é o procurador e “Principal” é a identificação da Orion. O texto da procuração faz uma ressalva: Cunha não teria poderes para “dispor ou retirar quaisquer desses ativos da conta”. O documento reproduz o nome do presidente da Câmara, a data de seu nascimento e sua nacionalidade. Há uma assinatura do próprio Cunha.
A conta em nome da Orion é justamente a mesma em que, em 2011, foram depositados 1,3 milhão de francos suíços. Esse dinheiro, segundo narrou o lobista João Henriques, é uma comissão por negócio fechado com a Petrobras em Benin. Henriques disse que fez o depósito por orientação de Felipe Diniz, filho do ex-deputado Fernando Diniz, já morto. Felipe nega ter dado tal indicação. Perguntando se sabia deste depósito na época, Cunha sustentou, na entrevista ao GLOBO, que não tinha acesso aos extratos e que o banco não o reconhecia como tendo ligação direta com a conta, porque tudo estava em nome da trust, da qual ele era apenas beneficiário.
— Se a conta fosse minha, se eu fosse o gestor da conta, poderia ter pago despesas diretamente. Mas não há uma assinatura minha no banco. Só tem assinatura minha do trust, não há movimentação financeira feita por mim. O banco não me reconhecia como movimentador da conta — disse Cunha, na semana passada, ao GLOBO.
Indagado se dava alguma orientação sobre os investimentos a partir das contas da Suíça, ele negou:
— Não (oriento aplicações). O que tem é quando prestam contas, uma vez por ano. Quando eles apresentaram os relatórios, teve muita discussão sobre essa performance (das aplicações) que estava negativa. Eu dizia o seguinte: “Essa aplicação mantida nos ativos, da forma como está, ela não vai ter retorno. É preciso um arranjo, estudem o rearranjo, como devem fazer, porque ela está produzindo uma perda”. E eles fizeram uma operação de arranjo.
Como se vê na procuração, Cunha podia fazer os investimentos pessoalmente; não precisava passar orientações.
Foto: Reprodução/O Globo