O ministro da Justiça, Torquato Jardim, jogou para a Polícia Federal (PF) a responsabilidade pelo pedido da tornozeleira eletrônica que garantiu a saída da prisão de Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR), ex-assessor especial do presidente Michel Temer. Jardim negou que o Departamento Penitenciário Nacional (Depen) – subordinado ao ministério – tenha feito o pedido formal à Superintendência de Administração Penitenciária do governo de Goiás.
– O pedido saiu da Polícia Federal. O Depen foi consultado se havia tornozeleira em Brasília, e não havia em Brasília. O órgão então avisou que havia em Goiás. E quem requereu a Goiás foi a Polícia Federal – disse o ministro em entrevista coletiva à imprensa na tarde desta quinta-feira.
Diante da negativa sobre a participação do Depen no episódio, a reportagem do GLOBO perguntou ao ministro:
– O Depen não pediu a tornozeleira?
– Quem pediu por escrito foi a Polícia Federal – respondeu Torquato.
– E por telefone, o Depen não pediu a tornozeleira?
– Procurou saber se havia, mas não pediu.
– O senhor tinha conhecimento de um pedido do Depen? Foi um gesto correto?
– Não tinha conhecimento. O gesto foi correto, não há nenhuma restrição ao Depen, que foi apenas um órgão de consulta.
A concessão da tornozeleira a Loures, o “deputado da mala”, foi feita pelo então superintendente de Administração Penitenciária de Goiás, o coronel da reserva da Polícia Militar (PM) Victor Dragalzew Júnior. Tanto ao Ministério Público em Goiás, que investiga o empréstimo do dispositivo, quanto em entrevista ao GLOBO publicada nesta quinta-feira o coronel afirmou que o pedido partiu do Depen. Segundo o coronel disse ao MP, o “coronel Jeferson” do Depen chegou a dizer que enviaria um ofício com o pedido, o que acabou sendo feito por um delegado da PF.
Ao jornal, Dragalzew disse que nunca havia recebido um pedido semelhante do órgão – uma tornozeleira para outro detento, em outra unidade da federação – durante sua gestão, iniciada em março de 2016. Depois do episódio, o superintendente foi demitido pelo governador de Goiás, Marconi Perillo (PSDB), na segunda-feira.
– O único caso foi este do deputado. O Depen nunca pediu para emprestarmos tornozeleiras a outros estados – afirmou o coronel à reportagem.
Antes de ser questionado diretamente sobre a tornozeleira que garantiu a semiliberdade ao amigo de Temer, Torquato afirmou na entrevista coletiva que os dispositivos são uma responsabilidade dos estados, e não da União:
– Cada estado tem sua própria licitação. Depen não é gerente direto de penitenciária, ele é órgão de consulta e financiamento.
Ele defendeu o uso do monitoramento eletrônico:
– Não há suficientes, li aí que estão produzindo uma montanha delas. É a solução mais de curto prazo para o sistema penitenciário. Os presos serão muito mais úteis num processo de integração do que isolados num presídio, até pelas condições dos presídios. A tornozeleira permite uma condenação de efeito útil mais rápido, reinsere o condenado mais rapidamente.
Loures foi preso pela PF em 3 de junho, por determinação do Supremo Tribunal Federal (STF), depois de ser filmado pela polícia correndo com uma mala contendo R$ 500 mil, suposta propina paga pela JBS e cujo destinatário seria Temer, segundo denúncia da Procuradoria-Geral da República (PGR). No último dia 1º, a prisão preventiva foi convertida em prisão domiciliar, sob monitoramento com uma tornozeleira eletrônica. A saída da prisão esfriou possibilidades de uma delação premiada.
O GLOBO mostrou na quarta-feira que o amigo de Temer furou uma fila onde estão um acusado de traficar 3,5 quilos de maconha, que permaneceu preso por faltar tornozeleira; um agressor enquadrado na Lei Maria da Penha, que permanece sem monitoramento mesmo depois de ter ameaçado de morte a ex-mulher; e empresários que lesaram centenas de clientes de pacotes de viagens. O Ministério Público de Goiás investiga a concessão da tornozeleira e pede a devolução do equipamento.
Reprodução: O Globo