Com dificuldades para preencher cotas de participação feminina em eleições, líderes de partidos na Câmara discutem abrandar as regras para as eleições do ano que vem. Uma das ideias é reduzir de 30% para 10% o porcentual mínimo obrigatório de candidatas mulheres a cargos no Legislativo. Outra proposta, já pronta para votação na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), prevê o fim das punições às legendas que não cumprirem a cota.
Para valer em 2020, quando serão escolhidos novos vereadores em mais de cinco mil cidades do País, as medidas precisam ser aprovadas até o início de outubro – isso porque alterações nas regras eleitorais precisam ser feitas até um ano antes da votação.
A proposta mais avançada para abrandar as regras é justamente de uma mulher. A presidente do Podemos, deputada Renata Abreu (SP), quer o fim das punições aos partidos caso o número mínimo de candidatas na eleição não seja cumprido. A medida já teve parecer favorável da deputada Bia Kicis (PSL-DF) na CCJ.
O partido de Bia é alvo da operação Sufrágio Ostentação, da Polícia Federal, que investiga o uso de mulheres como laranjas na disputa eleitoral do ano passado. A suspeita é de que o diretório de Minas Gerais da legenda tenha registrado candidatas apenas para justificar repasses do fundo eleitoral. O ministro do Turismo, Marcelo Álvaro Antonio, presidia o diretório mineiro à época – ele nega irregularidades.
Dos 24 candidatos que não receberam nem um único voto em 2018 – nem o próprio -, 21 eram mulheres. Destas, 17 não arrecadaram nem gastaram nada. Na Câmara, a bancada passou de 51 para 77 deputadas. Apesar do avanço, elas representam apenas 15% dos 584 parlamentares no Congresso Nacional.
“Queremos que os partidos mantenham a busca por candidaturas de cada gênero, mas que não sejam penalizados pelo quadro político que se apresentar em cada pleito”, afirmou Renata ao jornal O Estado de S. Paulo.
Em maio, o Congresso já havia aprovado uma anistia para partidos que não cumpriram a exigência de investir ao menos 5% do Fundo Partidário na participação feminina na política. Na ocasião, o projeto foi relatado pelo deputado Paulinho da Força (SD-SP), líder da bancada do Solidariedade. Ele também defende a alteração nas regras para as próximas eleições.
‘Laranjal’
Segundo deputados do Novo, o presidente da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), afirmou em reunião na semana passada que pretende colocar propostas de reforma política em pauta após a volta do recesso parlamentar. Procurado nesta terça-feira, 23, ele não foi encontrado.
A proposta de reduzir o porcentual mínimo de candidatas mulheres, em vigor desde a disputa de 2010, também é do Podemos. Autor do projeto, o líder do partido na Câmara, José Nelto (GO), justifica que a regra atual abre margem para fraudes.
“Cada partido terá liberdade para definir seu porcentual. A atual legislação favorece ao laranjal. Se continuar assim, 2020 será um festival de laranja como nunca se viu”, afirmou.
Tanto essa como a proposta de acabar com a punição enfrenta resistência na bancada feminina. A líder da frente, a deputada Professora Dorinha (DEM-TO), considera “vergonhoso” a Câmara discutir as medidas. “É muito ruim. Em minha opinião, não pode prosperar. Vamos lutar até o final contra esse projeto”, disse a parlamentar.
Sistema eleitoral
Além da discussão sobre as mudanças nas regras para as mulheres, a ideia, de acordo com os presentes na reunião com Maia, é de a Câmara voltar a debater mudanças na forma de se eleger deputados e vereadores, com a implantação do sistema conhecido como “distritão”.
Atualmente, a eleição para o Legislativo se dá pelo sistema proporcional – ou seja, para ser eleito, o candidato depende não apenas dos votos que recebe, mas também dos votos recebidos pelo partido ou coligação. Os assentos parlamentares são distribuídos conforme essa votação partidária.
Pelo chamado “distritão”, os eleitos seriam aqueles deputados e vereadores com maior votação, a exemplo do que ocorre com prefeitos, governadores, senadores e presidente. A medida serviria de transição para um modelo de votação chamado distrital misto, quando parte das cadeiras nas assembleias e câmaras municipais, além da Câmara dos Deputados, seriam destinadas aos mais votados e a outra parte aos eleitos regionalmente nos distritos eleitorais.
“Estamos tentando fazer um acordo de transição para agradar gregos e troianos, aprovando o ‘distritão’ em 2020 e 2022 e, a partir de 2024, o distrital misto”, afirmou o líder do Podemos.
Baixa representação
Ainda que a participação feminina no Congresso seja hoje a maior da história, as mulheres ocupam 77 das 513 cadeiras disponíveis na Câmara dos Deputados – o equivalente a 15%. Na Legislatura anterior, esse porcentual era de 9,5%.
Três Estados (Amazonas, Maranhão e Sergipe) não possuem nenhuma representante feminina em suas bancadas. Em outros sete Estados, há apenas uma representante do sexo feminino. Na Legislatura anterior, eram cinco os Estados sem nenhuma deputada e outros oito com apenas uma mulher como representante na Câmara.
Já os melhores índices de representatividade feminina são encontrados no Distrito Federal e Acre, que possuem cinco e quatro deputadas federais, respectivamente. Cada um tem direito a oito deputados. Ou seja, 65,5% das cadeiras da bancada do Distrito Federal são ocupadas por mulheres e, no Acre, a bancada é dividida.
Proporcionalmente, os dois Estados apresentaram o maior aumento da presença de mulheres nas bancadas federais em relação à Legislatura anterior: o DF aumentou de uma para cinco, enquanto no Acre a variação foi de uma para quatro. Já Tocantins, Pará, Caraá Amazonas e Maranhão, diminuíram sua bancada feminina na Câmara.
No recorte por regiões, o Nordeste tem o pior índice: apenas 12 dos seus 151 assentos na Câmara são ocupados por mulheres – menos de 8%.
Centro-Oeste e Norte possuem as maiores porcentagens de presença feminina na Câmara: 24,3% e 23%, respectivamente. Sudeste e Sul apresentam, cada um, pouco menos de 16% de mulheres entre seus deputados federais. As informações são do jornal O Estado de S. Paulo. // AO