O governo Lula (PT) publicou um decreto dias antes do Natal com definições sobre as atividades das guardas civis municipais no Brasil, e as mudanças endossam pleitos de corporações pelo país.
Entre os destaques estão as prerrogativas de patrulhamento preventivo, atendimento a ocorrências que representem risco grave à vida e à segurança de pessoas e de patrimônio e a possibilidade de fazer prisões em flagrante. O decreto passou a valer em 21 de dezembro.
Esses pontos têm sido motivo de debates na Justiça, com decisões em instâncias como o STJ (Superior Tribunal de Justiça) que anularam prisões por tráfico de drogas ou provas colhidas, geralmente associadas a abordagens em vias públicas.
A queixa mais frequente sobre as anulações é a falta de segurança jurídica para atuação das guardas, mencionada em mensagem do atual ministro da Justiça, Flávio Dino, que deixará o cargo no início do ano que vem para tomar posse no STF (Supremo Tribunal Federal).
“Guardas municipais mais fortes e com mais segurança jurídica para atuarem na segurança pública, em defesa da sociedade”, afirmou Dino, no X (antigo Twitter), ao divulgar o decreto.
Essa posição tem sido reiterada pelo governo ao longo do ano. Em setembro, o secretário nacional de Segurança Pública, Tadeu Alencar, afirmou à Folha que o STF começou a pacificar a discussão de competências ao reconhecer os agentes como integrantes do sistema de segurança pública. “Não é de uma vez por todas, mas vai dando condição de que a guarda esteja fortalecida por essa visão da constitucionalidade”, disse.
Em agosto, a decisão do STF foi considerada vitoriosa entre associações de classe de guardas e parlamentares ligados ao tema, mas não significou, segundo críticos, a autorização para guardas fazerem patrulhamento e abordagens —um dos pontos mais polêmicos.
No STJ, o entendimento atual diz que guardas podem fazer patrulhamento preventivo, desde que haja vínculo direto com bens, serviços ou instalações municipais, “e não de reprimir a criminalidade urbana ordinária, função esta cabível apenas às polícias, tal como ocorre, na maioria das vezes, com o tráfico de drogas.”
O trecho é de uma tese fixada em outubro pelo tribunal no julgamento de um habeas corpus. No caso, as provas usadas em uma condenação por tráfico foram consideradas ilícitas por terem sido obtidas por meio de busca pessoal, atividade que seria de competência da polícia.
Para o governo, o decreto não acirra os embates sobre competência, mas reforça a cooperação entre as forças de segurança para aspectos operacionais e de inteligência, além de oferecer segurança jurídica à atuação das guardas no município.
Segundo o texto, essa cooperação com os órgãos de segurança, como as polícias estaduais, a Polícia Federal e a Polícia Rodoviária Federal, por exemplo, será definida em termos dos municípios com os estados ou a União.
Ainda, a pasta prepara uma regulamentação para os padrões de atuação das guardas. O modo de atuação das forças municipais já foi alvo de questionamentos na Justiça, em denúncias de abusos, na criação de grupos ostensivos ou na aquisição e no uso de armamento pesado.
Para controlar, fiscalizar e corrigir excessos, caberia ao município ao qual o guarda está submetido criar corregedorias e ouvidorias externas. Uma crítica é a falta de previsão de órgãos de correção nos moldes das polícias, com juízes corregedores sem vínculos com o Executivo.
Ainda, aguarda despacho do presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira (PP-AL), uma Proposta de Emenda à Constituição que completaria esse ciclo de fortalecimento das guardas, com a mudança do nome das corporações para polícia municipal.
A sugestão teve assinaturas de 327 parlamentares, e abre a possibilidade para que os agentes tenham direito a regimes diferenciados de aposentadoria, nos moldes de policiais.