Estagnado na disputa a 10 dias do primeiro turno presidencial, Ciro Gomes (PDT) eleva o tom das críticas ao primeiro colocado nas pesquisas, o ex-presidente Lula (PT), buscando compará-lo ao atual chefe do Executivo, Jair Bolsonaro (PL).
A posição de Ciro, contudo, não encontra unanimidade nem em seu próprio partido. O ex-deputado estadual pelo Paraná, Haroldo Ferreira, assinou uma carta pedindo desligamento do diretório nacional e do cargo de vice-presidente da Fundação Leonel Brizola, em razão dos ataques de Ciro a Lula. No texto, ele defende ainda a candidatura do petista como melhor alternativa para derrotar Bolsonaro.
Na Bahia, os correligionários do PDT também divergem sobre a estratégia adotada por Ciro Gomes e pela legenda. Alinhado ao governo petista no estado, o vereador de Salvador, Henrique Carballal (PDT), cita outros momentos históricos onde grupos com opiniões contrárias se uniram para derrotar o fascismo.
Em entrevista ao Portal Salvador FM, Carballal, que é um dos coordenadores da campanha de Jerônimo Rodrigues (PT) ao Governo da Bahia, afirma que o único candidato hoje capaz de enfrentar o risco da reeleição de Bolsonaro, é o ex-presidente Lula. Ainda mais, a aposta em Ciro e sua ofensiva ao candidato do PT, na sua visão, favorece um segundo turno onde pode ser ainda mais difícil derrotar o atual presidente.
"A insistência hoje na candidatura de Ciro favorece um segundo turno, onde as forças fascistas conseguem ainda mais se unir. Isso já deixou de ser um erro, uma miopia política, e já passou a ser uma incorporação a esse projeto bolsonarista", critica o vereador.
Nesta quarta-feira (21), mais de 50 lideranças políticas da América Latina assinaram uma carta pedindo a retirada de candidatura de Ciro Gomes em nome da sobrevivência política: "a escolha fundamental não será entre Jair Bolsonaro e Luiz Inácio “Lula” da Silva, mas entre fascismo e democracia".
Carballal utiliza ainda o episódio recente da autodeclaração de Neto como pardo no sistema eleitoral, que gerou repercussão nacional e gerou memes compartilhados nas redes sociais, principalmente por opositores, para atacar a aliança feita por Ciro na Bahia.
Segundo o vereador, esta composição favorece somente ACM Neto, que, na verdade, visa apoiar veladamente o governo Bolsonaro.
"É muito estranho isso, pois na Bahia o candidato que fraude o sistema, o 'neguinho da Graça', não declara apoio a Ciro, e mesmo assim Ciro apoia ele. Parece que Ciro não está preocupado com a eleição dele, mas em manter o projeto de Bolsonaro, que sempre foi o objetivo de Neto. Neto é bolsonarista desde o início e Ciro está se tornando amigo da rede bolsonarista junto com ele", complementa Carballal.
Expulso do diretório estadual por discordar do apoio do PDT na Bahia à candidatura de ACM Neto (UB), Sandro Correia, defende o diálogo entre Ciro Gomes e Lula. Ele ressalta que a crise é mundial e que é preciso um posicionamento firme para que garanta ao Brasil a sobrevivência do seu regime democrático, "independente das contradições do PT".
"Nesse momento nós precisamos respirar. Nesse sentido, acredito em uma frente contra a ignorância, o racismo, a homofobia. Mas primeiro temos que criar um ambiente para as instituições voltarem a funcionar, que vá contra esse projeto de selvageria instalado no governo Bolsonaro", pontua Sandro, membro da Comissão de Ética do Movimento Negro Nacional do PDT.
Sandro chegou a colocar o seu nome como pré-candidato ao Senado, mas não teve o aval da sigla. Junto com o pedetista brizolista José Estevão, reivindicavam uma candidatura própria do partido ao Governo da Bahia, em detrimento da aliança com Neto.
"O melhor movimento agora é de diálogo entre Lula e Ciro, para o fortalecimento das demandas populares, que são a economia, a retomada dos empregos", assegurou o pedetista.
INCOMODADOS QUE SE MUDEM
Presidente do PDT na Bahia e o principal articulador do apoio da sigla a ACM Neto, o deputado federal Félix Mendonça Jr. crê que correligionários descontentes com a candidatura de Ciro mantida são minoria, e que não representa o direcionamento do partido.
Ele sugere ainda que aqueles incomodados com a posição tomada pelo PDT que optem pelo mesmo caminho escolhido pelo ex-deputado Haroldo Ferreira, e que busquem abrigo em outro partido.
"Acho que todos que tem opinião divergente deveriam fazer que nem este senhor e pedir o desligamento do partido e pode se filiar ao PT", disparou Félix. "Para mim, o voto útil é em Ciro Gomes. Eu voto no candidato do nosso partido, que representa propostas, e a eleição tem dois turnos para isso", complementou.
Félix recusou entregar o candidato com mais chances de receber o apoio do PDT caso Ciro não esteja no segundo turno, e negou que o ex-governador do Ceará priorize as críticas a Lula ao invés de Bolsonaro.
"Ele bate nos dois. Os bolsonaristas dizem que ele faz o serviço de Lula, e lulistas dizem que ele faz serviço de Bolsonaro […] no segundo turno eu vou seguir o que for decidido pelo partido com anuência do presidente nacional Carlos Lupi", concluiu.
Colega de Carballal na Câmara Municipal de Salvador (CMS), o vereador Anderson Ninho (PDT) reafirmou a sua subserviência a ACM Neto, líder do seu grupo político no estado. O edil parafraseia o próprio ex-prefeito da capital baiana, líder nas pesquisas de intenções de voto até o momento, que afirmou ter governado a cidade com presidentes de diferentes espectros políticos.
Em 2016, Neto governou por alguns meses no período da reeleição de Dilma Roussef (PT), até o seu impeachment. Depois, viu Michel Temer (MDB) assumir, na época em que o partido era aliado de Neto na Bahia. E, mais recentemente, com Bolsonaro. Apesar de evitar comentar o assunto, ACM declarou voto no atual presidente contra o PT em 2018.
Anderson Ninho garante que a ideia é apoiar Ciro até o final, e também evitou tornar pública a sua escolha em eventual segundo turno.
"Eu sigo orientação de ACM Neto, sigo a mesma linha que ele. Hoje estou com ele para governador […] o nosso presidente é Ciro, nós temos candidato", pontuou.
A reportagem entrou em contato com o deputado estadual Carlos Ubaldino e do vereador de Salvador, Émerson Penalva, ambos do PDT, mas até o fechamento não obteve retorno.