Desta vez não deu: sem chegar a um acordo, a bancada evangélica fez uma inédita votação para eleger seu novo presidente. Com bate-boca entre seus membros e ameaças de judicialização, a eleição não chegou a lugar algum e resolveu adiar a eleição.
A queda de braço eleitoral ficou entre os deputados Silas Câmara (Republicanos-AM) e Eli Borges (PL-TO).
É a primeira vez que o bloco recorre às urnas para decidir quem a guiará. Pleitos passados tiveram como praxe a aclamação de um presidente sem necessidade de votação. Assim aconteceu desde a criação da Frente Parlamentar Evangélica, em 2003.
Sem o costume de realizar eleições, a bancada sofreu diversos problemas com o processo de votação.
Parlamentares que não se inscreveram na lista conseguiram votar —manobra que o regimento interno não permite.
O deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), ex-presidente do bloco que passará o bastão e responsável por conduzir a eleição, disse que houve divergência entre a quantidade de votos e o número de parlamentares que assinaram a lista de presença.
“O nosso sistema, por problema de internet, tem várias quedas e por isso tivemos problemas na nossa lista [de membros da bancada evangélica]. Nós tivemos alguns que, por acharem que o nome estava na lista, colocaram seus votos. Por conta disso, minha decisão foi pela nulidade da eleição nesse momento e convocar nova reunião para a segunda quinzena de fevereiro”, disse.
O candidato que corre por fora, Eli Borges (PL-TO), não topou a proposta de revezar com Silas Câmara na chefia da bancada. A sugestão declinada: Borges seria presidente em 2024, e Câmara, neste primeiro ano de governo Lula (PT).
O jeito foi ir para voto. Inicialmente eram quatro na disputa, mas Otoni de Paula (MDB-RJ) e o senador Carlos Viana (Podemos-MG) desistiram de última hora da peleja eleitoral.
A anulação da votação só foi definida após mais de quatro horas de discussão. Nesse meio tempo, Otoni afirmou que, se o pleito não fosse anulado, entraria na Justiça. “Está sendo fraudada a eleição pelo grupo do Silas Câmara […] A gente não fala que é crente, a palmatória do mundo? Corrige gays, corrige todo mundo, e faz essa sacanagem aqui dentro?”
Um dos mais longevos evangélicos na Casa, com o primeiro dos sete mandatos iniciado no século 20, Silas Câmara é de uma família forte na Assembleia de Deus do norte. Seu irmão Samuel Câmara lidera em Belém a chamada Igreja-Mãe, a primeira expoente brasileira dessa denominação, fundada em 1911. Jonatas Câmara, outro irmão, está à frente da Assembleia de Deus no Amazonas.
Havia expectativa de um acordo entre os adversários aos 45 minutos do segundo tempo. Há precedentes.
O próprio Câmara, quando foi eleito pela primeira vez, em 2019, viu a pacificação em torno do seu nome ser selada no próprio dia. Cinco rivais abandonaram o páreo em seu benefício, incluindo Flordelis (então PSD-RJ). Três meses depois, seu marido seria assassinado, crime pelo qual ela acabou condenada no ano passado.
O bloco pretende ampliar seus espaços de poder na Câmara com a eleição de bancadas mais conservadoras na eleição de 2022.
Símbolo da força dos evangélicos, duas lideranças do segmento foram eleitas para os cargos de 1⁰ vice-presidente (Marcos Pereira, do Republicanos-SP) e 2⁰ vice-presidente (Sóstenes).
Recém-saído da presidência do grupo cristão, Sóstenes chegou a usar um adesivo com o rosto da deputada federal Maria do Rosário (PT-RS) durante a quarta-feira (1⁰), em apoio à eleição da petista para o cargo de 2ª secretária da Câmara. Aliado do pastor Silas Malafaia, ele costuma fazer da oposição do PT, partido ao qual se filiou por um breve período na juventude, um ponto de honra.
“Uso o adesivo hoje para respeitar o acordo entre os partidos, mas amanhã eu volto à oposição e defendo ideias contrárias às desse governo [Lula]”, disse o deputado, segundo a Folha.
Rosário, aliás, sentou-se à mesa com Sóstenes e outros cabeças da bancada. Ela já havia ido a um café da manhã oferecido na terça (31) pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-PI), a parlamentares evangélicos, o que aborreceu parte deles.
Marco Feliciano (PL-SP) não esqueceu que a petista, enquanto ministra de Direitos Humanos de Dilma Rousseff, fez o que pode para não deixá-lo presidir a Comissão de Direitos Humanos da Casa e o acusou de incitar o ódio. Ele chegou ao cargo em 2013, por indicação do seu partido à época, o PSC, que fez um acordo com o PT.