Política

Após derrotas em série, pacote de segurança vira teste de fogo para Moro

Apontado como "superministro" e "indemissível" no início da gestão de Jair Bolsonaro (PSL), o ex-juiz Sergio Moro (Justiça) lança nesta quinta-feira (29) um projeto-piloto que vem sendo trabalhado há meses

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[ Após derrotas em série, pacote de segurança vira teste de fogo para Moro ]

Apontado como "superministro" e "indemissível" no início da gestão de Jair Bolsonaro (PSL), o ex-juiz Sergio Moro (Justiça) lança nesta quinta-feira (29) um projeto-piloto que vem sendo trabalhado há meses por sua equipe como importante aposta de ação concreta do governo federal no combate à criminalidade violenta no país.

Foco dos vazamentos de mensagens privadas que mostram atuação parcial na Lava Jato, em seu período de magistrado, Moro vem passando por progressivo desgaste, com destaque para a resistência do Congresso em aprovar seu pacote anticrime.

Além disso, ações de Bolsonaro minam sua autoridade e peso político dentro do governo, como a ameaça de intervenção na nomeação de superintendente e diretor-geral da Polícia Federal.

Com isso, o lançamento do chamado "Em Frente Brasil, Programa Nacional de Enfrentamento à Criminalidade Violenta" torna-se um teste de fogo para o ministro, que nesta semana viu o STF (Supremo Tribunal Federal) anular pela primeira vez uma sentença sua na Lava Jato.

Além de eventuais percalços políticos, o programa de segurança pública larga com um entrave que ameaça sua expansão, a escassez de recursos nos cofres federais.

Só para a fase inicial de teste, que envolve uma cidade de cada região do país, o plano têm custo de R$ 20 milhões, além de gasto com a mobilização de 500 policiais da Força Nacional de Segurança e de outros recursos que serão discutidos para aplicação a partir de 2020.

Se esse padrão for seguido, só para ser iniciado nas principais cidades que concentram, segundo as estatísticas, metade dos crimes violentos do país, seria preciso um orçamento anual de pelo menos R$ 480 milhões, sem contar o gasto com a multiplicação do contingente da Força Nacional, tudo isso em meio ao cenário de fortes restrições orçamentárias.

Moro, inclusive, tenta evitar que sua pasta perca recursos na proposta de Orçamento para 2020 que o governo tem que enviar ao Congresso ainda nesta semana.

O programa federal de combate à criminalidade violenta vem sendo trabalhado desde o início do ano pela equipe do ministro, tendo selecionado cinco cidades brasileiras que integram o grupo das 120 mais violentas do país, segundo o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).

Goiânia (GO), Ananindeua (PA), Cariacica (ES), Paulista (PE) e São José dos Pinhais (PR) foram selecionadas com base nas altas taxas de homicídio e na avaliação de fatores considerados favoráveis ao sucesso da fase inicial, como a aprovação política do governador de cada estado, que é quem tem pela lei a maior responsabilidade pela segurança pública.

Dois desses governadores são do oposicionista PSB —Renato Casagrande, no Espírito Santo, e Paulo Câmara, em Pernambuco—, mas têm apoiado e colaborado com o plano.

A previsão é a de que essas cidades recebam recursos federais iniciais de R$ 4 milhões, cada uma, para incremento de ações de inteligência e aperfeiçoamento tecnológico —instalação de centrais de monitoramento, por exemplo.

Além disso, foram despachados aos cinco municípios equipamentos e 500 policiais da Força Nacional (100 para cada cidade), cuja tarefa será trabalhar em conjunto com as PMs e eventuais guardas municipais locais no patrulhamento ostensivo (80% do contingente) e na parte de investigação (20%).

A Força Nacional ficará nas cidades até o final deste ano, período que poderá ser prorrogado a depender dos resultados obtidos.

A partir de 2020 está prevista a implantação da segunda fase do programa, que envolve novos recursos —não informados— e a participação de mais nove ministérios com ações sociais, de educação, saúde, lazer e esporte, entre outros.

A intenção de Moro é que o eventual sucesso da proposta sirva de base para a expansão dessas ações para mais cidades que hoje integram o rol das mais violentas do país.

Caso o plano dê certo, ele representará um importante cartão de visitas para o ministro da Justiça, cujo nome é cogitado até mesmo para concorrer contra Bolsonaro em 2022, em caso de rompimento entre os dois.

Conforme a Folha mostrou nesta quarta-feira (28), os investimentos previstos no Orçamento de 2020 para todo o governo federal devem sofrer forte redução, ficando na faixa entre R$ 25 bilhões e R$ 30 bilhões, o menor desde ao menos 2007.

Segundo o Atlas da Violência 2019, Retratos dos Municípios Brasileiros, do Ipea, 120 municípios concentram metade dos homicídios no país.

As estatísticas reunidas pelo Ministério da Justiça mostram queda nos crimes violentos em 2019, mas a linha de declínio já era observada antes da posse de Bolsonaro.

Além de problemas de padronização e metodologia que ainda afetam a credibilidade dos dados, é praticamente consenso entre especialistas que não houve ação federal, até o momento, com capacidade de alterar estatísticas da segurança pública, cuja gestão é majoritariamente de responsabilidade dos estados.

Em nota, o Ministério da Justiça afirmou que a partir dos diagnósticos locais serão definidos os valores futuros de investimento e eventual expansão, o que só será definido a partir de 2020.

"É importante ressaltar que uma das virtudes do projeto-piloto é permitir que políticas, projetos e programas já existentes possam convergir para territórios com relevantes indicadores de criminalidade, de forma a qualificar os gastos de maneira articulada entre os entes federados."

O ministério afirmou ainda que, para a elaboração do projeto, foram levadas em conta "experiências exitosas nacionais e internacionais, de prevenção e redução de criminalidade violenta, com o uso de metodologias modernas de governança e gestão", e que as ações têm como foco "a mitigação de fatores socioeconômicos de vulnerabilidade de cada território, enfrentando-se, assim, não apenas as consequências, mas as causas do problema".
Programa Nacional de Enfrentamento à Criminalidade Violenta

Cidades escolhidas

Cariacica (ES)
Taxa de homicídio por 100 mil habitantes: 59,8
Governador: Renato Casagrande (PSB)*

Goiânia
Taxa de homicídio:‚ 40,7
Governador: Ronaldo Caiado (DEM)

Ananindeua (PA)
Taxa de homicídio:88,1
Governador: Helder Barbalho (MDB)

Paulista (PE)
Taxa de homicídio: 62,3
Governador: Paulo Câmara (PSB)*

São José dos Pinhais (PR)
Taxa de homicídio: 41,8
Governador: Ratinho Jr (PSD)

Ações do programa

Reforço
Cada uma das cidades receberá 100 policiais da Força Nacional por um período inicial de 4 meses, além de equipamento

Policiamento
Do contingente extra, cerca de 80% atuará ao lado da PM local no policiamento ostensivo e 20% trabalhará na parte investigativa

Recursos
Cada município receberá uma verba extra federal para aplicação na segurança pública, nas áreas de inteligência e tecnologia, por exemplo

Ação integrada
Uma segunda fase envolverá a participação de dez ministérios (Justiça e Segurança Pública, Casa Civil, Saúde, Economia, Educação, Cidadania, Desenvolvimento Regional, Secretaria-Geral, Secretaria de Governo e Direitos Humanos) com trabalho nas áreas de cultura, esporte, lazer, educação, assistência social, entre outras

Folhapress // AO