Crise política, baixa confiança da população nos partidos e fim do financiamento privado de campanha. O cenário da disputa eleitoral deste ano tinha tudo para desmotivar o lançamento de candidaturas. Sem recursos, a saída para as legendas seria reduzir o número de competidores. Mas não foi isso que aconteceu. Dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) revelam que o Brasil terá 485 mil candidatos a prefeito, vice-prefeitos e vereadores, um volume quase 1% maior que o registrado em 2012. O comparativo considera todos os registros antes do julgamento feito pelo TSE, a quem cabe deferir ou não as candidaturas.
Pelos dados, a crise parece ter afetado mais as estratégias do PT. Entre os partidos que disputam prefeituras, a legenda reduziu quase à metade as suas candidaturas. Serão 992 frente aos 1,8 mil de 2012. PTB e PR também apresentam variação negativa no período. Apesar disso, o número de candidatos a prefeito, considerando todos as siglas, é 3% maior este ano. O PMDB lidera a lista com mais de 2,3 mil candidatos.
Para o professor Sérgio Braga, do programa de pós-graduação em ciência política da Universidade Federal do Paraná (UFPR), os dados sinalizam que o sistema político nacional precisa ser compreendido para além das regras eleitorais e do financiamento de campanha. Segundo ele, o maior número de candidaturas mostra que a crise gerou oportunidade para o surgimento de novos candidatos.
— O sistema político brasileiro passou por uma crise séria nos últimos anos, com manifestações de rua, organização de novos partidos, surgimento de novos atores relevantes. No Brasil, há também o que chamo de motivo “salvacionista”. O sujeito pensa: “sou honesto e cidadão de bem”, logo posso contribuir para a melhoria da sociedade brasileira — diz Braga.
Para Luciana Veiga, professor associada da Universidade Federal do Estado do Rio (Uni-Rio), a queda no número de candidatos petistas a prefeito reflete a crise pela qual passa o partido, com os efeitos da Operação Lava-Jato e o processo de impeachment da presidente afastada, Dilma Rousseff.
— O desgaste do PT não se verifica de forma uniformizada. Há mais rejeição em Santa Catarina e menos em Pernambuco, apenas para ilustrar. Diante desse quadro, ficou mais difícil para o PT montar coligações e encabeçar chapas. Pode haver situações em que o partido cede a cabeça de chapa para um partido aliado, tendo como contrapartida o apoio para a retomada de uma narrativa mais favorável de defesa do PT — diz Luciana.
Secretário de Comunicação Social do PT, Alberto Cantalice, minimizou essa redução:
— Mesmo tendo uma redução no número de candidatos, vamos disputar uma quantidade de eleitores maior. Disputaremos com candidato próprio em 20 capitais e teremos um número maior de candidatos em cidades com retransmissora de TV. A diminuição se deu principalmente em cidades pequenas. Acreditamos que poderemos alcançar um número de votos equivalente ao de 2012, quando fomos a legenda mais votada.
Sobre o financiamento de tantas candidaturas, Braga crê que os competidores com maior capacidade de autofinanciamento, como empresários, comerciantes e os vinculados a igrejas, devem se sobressair:
— Se tivesse que elaborar uma hipótese, diria que haverá um grande aumento em empresários e evangélicos nas próximas eleições, além de representantes da “nova” direita e “nova” esquerda. Tenho fortes dúvidas se isso contribuirá para o aumento da qualidade da democracia brasileira. Na verdade, temo que ocorra o contrário.
Já Luciana acha que a proibição do financiamento ampliou a importância das siglas com maior capilaridade pelo país.
Segundo o TSE, cerca de 7,21% dos candidatos são agricultores; 6,54%, servidores públicos. Os homens são maioria (69%).
Em 99 municípios, a disputa para as prefeituras deverá ter baixo custo. Nessas cidades, há só um candidato a prefeito. Por outro lado, a competição deve ser acirrada em Campo Grande, onde há 15 candidatos a prefeito, maior número do país numa única cidade. Em 2.260 municípios haverá só dois candidatos; 1.585, serão três.
Fonte: O Globo