A atuação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) no início do governo não tem agradado grande parcela do agronegócio. Já integrantes do governo dizem que o setor tem registrado avanços, especialmente no mercado internacional.
De um lado, produtores rurais reclamam de um esvaziamento do Ministério da Agricultura, de outro, o governo faz acenos frequentes à causa ambiental. Os conflitos dificultam ainda mais pavimentar o caminho para uma reconciliação de Lula com um setor fortemente influenciado pelo ex-presidente Jair Bolsonaro (PL).
Já era aguardada pelo agronegócio uma gestão que desse mais prioridade à preservação do ambiente em relação à anterior, mas a expectativa era que o mandatário se empenhasse mais na missão de fortalecer pontes com o setor.
É comum em todos os governos a existência de disputas internas entre os ministérios do Meio Ambiente e da Agricultura. Esse foi um dos principais motivos, por exemplo, do pedido de demissão de Marina Silva da pasta ambiental em 2008, quando, entre outras situações, entrou em rota de colisão com colegas por ser contra a ideia de flexibilizar a restrição de crédito agrícola a quem desmatou sem licença ambiental e sem registro da propriedade.
Em seu terceiro mandato, Lula dá sinais de que não pretende correr o risco de perder mais uma vez Marina, que voltou à chefia da pasta 15 anos depois.
Nessa linha, o presidente fortaleceu os ministérios do Meio Ambiente e do Desenvolvimento Agrário e enfraqueceu o da Agricultura.
A pasta responsável por dialogar com o agronegócio perdeu o comando de diversas áreas em relação ao último governo –como a estatal Conab (Companhia Nacional de Abastecimento), a pesca (que virou um ministério) e o cooperativismo.
A função do ministério, agora, ficou mais voltada à fiscalização da produção de alimentos e à política agrícola.
O Ministério do Desenvolvimento Agrário, por sua vez, foi recriado e fortalecido. A pasta responde pela questão das cooperativas, pela Conab e pelo Sistema de Gestão Fundiária, que estava no Incra (Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária).
Para a chefia da pasta do Desenvolvimento Agrário, foi escolhido o deputado federal eleito pelo PT, Paulo Teixeira (SP).
Na Conab, o petista nomeou o ex-deputado estadual e candidato a governador em 2022 do Rio Grande do Sul Edegar Pretto, que tem uma ligação histórica com o MST (Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra).
Integrantes do Ministério da Agricultura e da bancada ruralista se aliaram para tentar reduzir o enfraquecimento da pasta. Isso pode ser feito com articulação política no Congresso.
Segundo políticos ligados ao agronegócio, a força do chefe do Desenvolvimento Agrário no governo ficou clara numa reunião recente sobre a estiagem no estado gaúcho.
O encontro ocorreu no Ministério de Agricultura, que historicamente tratou do tema e é chefiado pelo senador licenciado Carlos Fávaro –mas quem conduziu a reunião foi Teixeira.
Ruralistas também reclamam de o ministro do Desenvolvimento Agrário ter afirmado, em entrevista à Folha, que os títulos dados por Bolsonaro a assentados são “papel de pão” e não têm valor jurídico.
Isso sinaliza que ele considera nula a principal ação da gestão anterior na área de reforma agrária, a distribuição de títulos de propriedade para assentados.
Outra crítica do setor é que o Cadastro Ambiental Rural saiu do Ministério da Agricultura e foi para o Ministério do Meio Ambiente, o que gera temor de que a pasta de Marina Silva possa dificultar o acesso dos produtores ao programa de regularização ambiental.
Integrantes do governo dizem que as medidas adotadas por Lula mudaram a imagem do Brasil no exterior e isso tem gerado avanços na área.
O governo tem ressaltado que, logo no primeiro mês, a China habilitou mais 25 frigoríficos brasileiros a exportarem para o país. A Indonésia, por sua vez, habilitou 11 frigoríficos brasileiros de carne bovina.
Enquanto isso, Lula retomou uma agenda de relações bilaterais com a Alemanha, maior economia da Europa, e um dos principais agentes para destravar o acordo do Mercosul com a União Europeia.
Para integrantes do Ministério da Agricultura, o principal desafio será continuar mostrando que o governo terá uma atuação implacável com o desmatamento ilegal e que a agenda sustentável tem ganhado cada vez mais espaço.
Depois de visitar a Argentina, Uruguai e os Estados Unidos, Lula deve ir à China, principal parceiro comercial do Brasil.
Apesar da aproximação com países consumidores de produtos brasileiros, ruralistas ainda são céticos em relação ao efeito da imagem de Lula e Marina para o agronegócio no exterior.
Empresários do setor estão concentrados ainda em questões internas e dizem que atuação de Lula neste ano não condiz com a condução da campanha petista no ano passado.
Devido à grande influência bolsonarista, o agronegócio foi eleito como um dos principais desafios do então candidato à Presidência da República.
Para criar pontes com o setor, Lula se aproximou do ex-deputado Neri Geller e de Fávaro. Ambos passaram a ser os responsáveis por tratar de agronegócio com Lula e por reduzir a resistência ao petista entre os produtores rurais e entidades da área.
Uma vez eleito, Lula nomeou Fávaro ministro, mas frustrou o movimento de Geller para se tornar chefe da Conab.
Folhapress