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"Falam descaradamente de nazismo para que vire coisa normal", dispara Hélio Bentes

O vocalista da banda de reggae Ponto de Equilíbrio diz que o Brasil regrediu com o governo Bolsonaro

Portal Salvador FM
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Há 22 anos à frente da banda de reggae Ponto de Equilíbrio, o cantor e compositor Hélio Bentes crê que o Brasil regrediu nos últimos anos, desde que o início do governo Bolsonaro. Para além do país onde vive, o artista diz que o mundo inteiro hoje está "meio doido", com pautas como o nazismo sendo retomadas e ocupando os noticiários. 

Em conversa com o Portal Salvador FM no último sábado (12), momentos antes de subir ao palco do Largo da Tieta, no Pelourinho, Helinho disse que as falas sobre o nazismo, do ex-apresentador do Flow Podcast, Monark, e do deputado federal Kim Kataguiri (DEM-SP), são uma forma de fazer com que o assunto passe a ser considerado uma "coisa normal".

"Na nossa visão, o Brasil deu uma regredida. Muito preto, favelado, morrendo nas periferias, o aumento de feminicídios, da homofobia, tudo isso cresceu escancaradamente. Agora, os caras falando descaradamente de nazismo, para que isso comece a ser normal. O mundo está meio doido, não é só no Brasil […] é um regresso, é algo que me deixa triste, ansioso, passo mal com essa parada por me sentir importante", lamenta o cantor.

Nas redes sociais, uma tese sobre a fala de Monark foi analisada por um professor de história como uma representação da tentativa de deslocamento da "Janela de Overton", que seria uma janela onde estão incluídos assuntos politicamente aceitáveis de serem discutidos e implementados, de acordo com a opinião pública.

Nascido e criado no Morro do Macaco, em Vila Isabel, Hélio Bentes fala também do aumento de crianças e adolescentes envolvidas no tráfico de drogas e diz que a sua compaixão é por ver de perto a realidade.

"Não é 'defender bandido'. São seres humanos que tem um coração. A maioria da molecada que entra no crime não é porque é mal, é porque acredita que é quase natural", reflete.

Acostumado a subir aos palcos com os integrantes da Ponto de Equilíbrio, o artista encara turnê com show solo no estilo SoundSystem, somente com um dj na pickup e com bases de sucessos da banda que marcaram a sua carreira. Ele explica as diferenças e um pouco da cultura soundsystem, que assim como o reggae, nasceu na Jamaica, um pouco antes nos anos 1940.

"O soundystem é o avô do hiphop. Na Jamaica, no começo, não tinha a cultura de banda, era um trio de vocais, como The Wailers [banda que Bob Marley começou a carreira]. Nem sempre tinha uma banda, ou não queriam tocar com o cara que tava começando, aí vem o soundsystem, com uma caixa de som, a galera na rua, a vibe é essa, interagir como público. Quero ajudar a difundir a parada", diz o artista, que conta que faz o show-solo há 9 anos, mas retomou com a pandemia e a impossibilidade de ensaiar constantemente com os músicos de Ponto.

PRECONCEITO

Dono de um sucesso pouco visto no reggae nacional, Hélio Bentes acredita que o reggae permeia a música popular brasileira apesar de todo o "preconceito". Segundo o cantor, bandas como Paralamas do Sucesso, Skank, e na atualidade artistas como Iza, bebem diretamente da fonte do ritmo jamaicano, mas não levantam a bandeira.

"Complicado falar da cena reggae, pois envolve muita coisa. Sempre esteve na cultura da música brasileira, mas a galera não assumia que era reggae. Paralamas do Sucesso, Skank, fizeram mais reggae do que qualquer. A Iza, que é cultura pop, não é exatamente reggae, mas é dancehall, uma vertente, mas a galera não assume tanto", avalia.

"É ruim falar porque acaba meio que cutucando e minha intenção não é falar mal, Skank, Paralamas, Iza, são todos muito fodas, mas rola um bloqueio do mercado […] o reggae é tão bom, que ele vai permeabilizando, invadindo, mas é difícil se consolidar no Brasil", complementa.

Para Helinho, o país ainda tem uma parcela grande de "conservadores" que contribuem para a associação do reggae à marginalidade e, principalmente, ao consumo de drogas, em especial a maconha.

"Existe a barreira do preconceito, um povo muito conservador. Mas o reggae tem um público muito leal, fiel, que não vê em outros movimentos. A gente toca, nunca mais parou, mas muita coisa no caminho outros artistas, se diluiu. A verdade é muito mais complexa do que isso", pondera.