O governo ampliou a margem do crédito consignado para beneficiários do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) de 35% para 40% do total dos ganhos mensais (5% para saque no cartão de crédito). Os novos limites valem até 31 de dezembro. Porém, a Medida Provisória 1.006, publicada na quinta-feira, causou controvérsias. Embora a decisão possa animar quem está mergulhado em dividas, especialistas alertam para a possibilidade de aumento da inadimplência e até dos índices de violência contra idosos, que podem ser pressionados por familiares a tomar crédito sem necessidade.
A demanda pelo consignado, desde o início do ano, vem crescendo principalmente entre os beneficiários do INSS. O montante emprestado pelos bancos para esse público passou de R$ 140,2 milhões, em janeiro, para R$ 147,7 milhões, em agosto, segundo o Banco Central. E somente de julho para agosto, a procura subiu 1,7%. No trimestre, avançou 3,4%. Nos oito meses de 2020, elevou-se em 6,5%. E, em 12 meses, 8,6%. Esses percentuais são maiores aos dos trabalhadores da iniciativa privada e dos servidores públicos — esses últimos só ultrapassaram na comparação dos 12 meses (12,6%).
O crescimento desse tipo de crédito tem provocado um endividamento crescente. Em dezembro de 2019, as dívidas de aposentados e pensionistas no crédito consignado atingiram o maior nível da história: R$ 138,7 bilhões. Outro problema é a pressão dos bancos para que os aposentados contratem empréstimos. De janeiro de 2017 a maio de 2020, a Ouvidoria do INSS recebeu mais de 130 mil reclamações sobre empréstimos consignados feitos sem autorização.
O economista Cesar Bergo, sócio-consultor da Corretora OpenInvest, concorda que, nesse momento de emergência, é fundamental que o governo lance medidas para socorrer as pessoas. Mas faz ressalvas. “Esse aumento de 10 pontos percentuais na margem pode repercutir em alta de até 25% dos recursos disponíveis para empréstimo, mas também no volume de endividamento e de inadimplência”, afirma.
Para Bergo, é preciso que “as pessoas tomem muito cuidado e só usem mesmo o dinheiro se tiverem necessidade”. “Quem busca o consignado só vê o valor das parcelas, mas não atenta que vai pagar caro”, lembra o economista. Embora sejam menores do que os de outras linhas de crédito, os juros do consignado estão, em média, em 1,3% ao mês, ou pouco mais de 17% ao ano.
Técnicos em previdência e seguro social são contra o aumento na margem consignável. De acordo com Sandro Alex de Oliveira Cezar, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Seguro Social (CNTSS), aumentar o endividamento não é a solução. “Apenas concentra o dinheiro dos trabalhadores na mão dos bancos. A lógica é a seguinte: congela salários, libera o crédito. O povo, sem poder de compra, se endivida. Imagina como é viver com 55% do salário mínimo”, destacou Cezar.
Para Nery Júnior, coordenador nacional do Movimento Acorda Sociedade (MAS), seria mais adequado que o governo fizesse um programa de recuperação financeira das pessoas endividadas, por meio dos bancos públicos.
Para os bancos, o consignado tem sido um negócio lucrativo, como destaca Eduardo Velho, economista-chefe da JF Trust. Ele observou que, ontem pela manhã, as ações dos bancos estavam entre as maiores altas da Bolsa de Valores de São Paulo (B3). Subiram os papéis do Santander (3,01%), Bradesco (2,70%), Itaú Unibanco (2%) e Banco do Brasil (1,70%). As altas não se sustentaram, destaca Velho, porque a Bolsa recuou diante de desentendimentos entre membros do governo.
“Para os bancos, o efeito da medida é positivo, assim como para os beneficiários do INSS. Embora a MP tenha baixo impacto na atividade econômica, vai ajudar muita gente que teve queda real na renda”, afirmou.
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da Redação do LD