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Usuários são banidos de página da Secretaria da Segurança de SP no Facebook

Pasta do governo paulista bloqueou pessoas que criticavam falta de agentes na Polícia Civil pela rede social. Em nota, secretaria negou a prática.

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 src=A Secretaria da Segurança Pública (SSP) de São Paulo baniu, de sua página no Facebook, usuários que questionam o governo estadual acerca da falta de agentes na Polícia Civil paulista. Segundo levantamento realizado pelo G1 com informações do Portal da Transparência, a instituição atua, hoje, com apenas 75% do efetivo determinado por lei.

Para evitar as críticas na rede social, a SSP já bloqueou diversos perfis. Agora, os banidos não podem comentar nos posts da pasta e nem “reagir” a eles, como mostrar-se “triste” ou “irritado” em relação às publicações. Usuários enviaram prints ao G1 mostrando que não podem nem mais "curtir" a página. O perfil é usado constantemente para divulgar ações do governo Alckmin e é seguido por mais de 400 mil pessoas.

A Secretaria da Segurança Pública de São Paulo negou que tenha apagado comentários com críticas ao governo ou à própria pasta e disse que tampouco bloqueou usuários por este motivo. No entanto, explicou que usuários que fazem comentários com ameaças, por exemplo, podem ser excluídos.

"Uma simples consulta na Fan Page da SSP mostra diversos desses comentários críticos. Porém, comentários que contenham, por exemplo, material discriminatório, ofensivo, racista, ameaças, textos, fotos e vídeos de teor pornográfico, violento, estes são excluídos e, se o usuário insistir, poderá ser bloqueado", alegou, em nota.

Boa parte dos banidos são pessoas que já passaram em concursos públicos para atuar na Polícia Civil, mas ainda não foram nomeados pelo governo, mesmo com o déficit de funcionários na instituição. Alckmin promoveu certames entre 2013 e 2014. Anunciou mais de 3 mil vagas, mas até agora não as preencheu com a justificativa da crise econômica.

Felipe Pereira, de 31 anos, é um dos muitos aprovados que aguardam há anos a convocação para reforçar o quadro da Polícia Civil. Ele passou no concurso para desenhista técnico-pericial, cargo que compõe o braço científico da instituição, e foi impedido de comentar nas postagens da SSP no Facebook depois de questionar a pasta a respeito das contratações.

“Eu comentava sempre as publicações. Cobrava de forma respeitosa para não sofrer algum tipo de retaliação futuramente, mas fui bloqueado. Acredito que por questionar e acabar queimando o filme do governo. Eu achei uma forma de censura esse bloqueio”, disse ele.

O receio de uma possível retaliação do futuro empregador fez com que outro aspirante a policial civil preferisse não se identificar. Aprovado para o cargo de investigador, ele foi outro a ser bloqueado pela secretaria na rede social. “Se existe a censura com uma simples pergunta, imagina o que pode acontecer depois”, explica.

De acordo com ele, o banimento ocorreu após um comentário na página sugerindo que havia uma priorização da Polícia Militar em detrimento da coirmã, Civil, por parte do governo: “Perguntei por que alegam que não têm dinheiro para contratar policiais civis, mas já abriram um novo concurso para a PM, de 3 mil vagas, agora em 2017”.

“Como cidadão que honro meus impostos, me senti ofendido. De fato a democracia hoje em dia está abalada. Eles não enfrentaram o questionamento de um cidadão. Simplesmente me bloquearam. Não fui ofensivo. Eu merecia era uma resposta”, completou. O post em questão ainda foi apagado pelo governo depois.

A advogada Tatiane Brito de Santana, de 30 anos, foi outra banida por expressar opiniões que, segundo ela, contrariavam os interesses do governo. “Sempre rebatia o que eles divulgavam. Na semana passada, descobri que fui bloqueada. Eu sei o que é legal e ilegal. A gente tem direito de se manifestar e em nenhum momento ofendi a honra de ninguém. Só contestei as informações”, disse.

Para ela, o governo usa a rede social “para fazer uma propaganda enganosa para a população”. “Querem censurar o pessoal que tenta mostrar o que está acontecendo de verdade. Falam que estão colocando policiais na delegacia, mas dados do próprio governo mostram que não. Tudo que coloquei lá era baseado em dados”, acrescentou.

Questão ética

O professor e especialista em direito público Luiz Fernando Prudente do Amaral diz que a exclusão de comentários e o bloqueio dos usuários não é condenável do ponto de vista legal, mas, da perspectiva ética, “não parece muito ajustado”. “Quer diz que só pode se manifestar com comentários elogiosos? Não faz muito sentido”.

“Quando o órgão opta por ter uma página na rede social é bastante claro que ele quer se aproximar do cidadão em relação à transparência e também ouvir o que o cidadão tem a dizer. Esse tipo de conduta está simplesmente acabando com a finalidade de se participar de uma rede social. Não me parece correto”, concluiu ele.

Governador justifica déficit

O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), afirmou em entrevista concedida na semana passada que mudanças nas regras de aposentadoria provocaram o problema da falta de funcionários na Polícia Civil paulista.

“Nós perdemos policiais primeiro porque o Congresso Nacional aprovou uma lei absurda há dois anos atrás, quando a população está vivendo mais, diminuindo a expulsória de 70 para 65 anos de idade”, afirmou.

De acordo com ele, apesar de ter sido revogada, a lei fez com que o quadro da Polícia Civil perdesse 1700 agentes. “A lei é tão absurda que um ano depois mudou, mas quem saiu não pode voltar mais. Já foi corrigido, mas perdemos”, explicou.

Segundo o governador, a atual reforma da previdência proposta pelo governo federal e em discussão no Congresso Nacional também fez com que muitos policiais dessem entrada no pedido de aposentadoria. Na contagem de Alckmin, 1000 agentes deixaram a Polícia Civil só em 2016.

Reprodução: G1