Na noite do dia 12 de maio de 2015, um jantar de gala para 1.100 pessoas no famoso hotel Waldorf Astoria de Nova York reuniu os ex-presidentes do Brasil Fernando Henrique Cardoso (PSDB) e Bill Clinton, dos Estados Unidos.
A dupla recebeu o título de "Personalidade do Ano", premiação concedida anualmente pela Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos. Entre empresários e políticos presentes ao jantar, estava o senador e presidente nacional do PSDB, Aécio Neves. Apesar de o jantar de gala ter se limitado à homenagem a FHC e Clinton, a ida de Aécio a Nova York custou R$ 20.042,67, pagos com recursos do fundo partidário.
O fundo partidário, cujo nome oficial é Fundo Especial de Assistência Financeira aos Partidos Políticos, é um montante repassado todos os anos pelo poder público para os partidos formalmente registrados junto ao TSE (Tribunal Superior Eleitoral). Para receber o dinheiro, que serve para atividades partidárias, as siglas devem estar com suas prestações de conta em dia. Em 2015, o fundo distribuiu R$ 867 milhões aos partidos. A análise das contas dos partidos é feita pela Asepa (Assessoria de Exame de Contas Eleitorais e Partidárias), vinculada ao TSE, e isso ainda não tem prazo para ocorrer.
Nesta semana, o UOL publicou uma série de reportagens mostrando como os três partidos que mais recebem dinheiro do fundo — PT, PSDB e PMDB — gastam esses recursos. Há desde viagens de dirigentes pagas com dinheiro público afinanciamento de churrascos e contratação de assessores.
A legislação que regula o uso do fundo partidário prevê que ele possa ser utilizado para o pagamento de passagens e de hospedagens a dirigentes e funcionários do partido.
Não há proibição para que esses recursos sejam gastos no exterior, mas o órgão que fiscaliza a regularidade das contas prestadas pelos partidos, a Asepa (Assessoria de Exame de Contas Eleitorais e Partidárias), vinculada ao TSE, cobra que as viagens custeadas com recursos do fundo partidário tenham relação com a ação desempenhada pelas legendas. Um dos elementos considerados pelos analistas da Asepa é se as atividades custeadas no exterior correspondem ao que diz a Lei 9.069/1995 (a Lei dos Partidos Políticos), que estabelece que a ação dos partidos políticos brasileiros deve obedecer ao "caráter nacional".
O PSDB foi o segundo partido que mais recebeu recursos do fundo partidário em 2015 — foram R$ 96 milhões. O PSDB só ficou atrás do PT, com R$ 116 milhões. Em terceiro lugar, ficou o PMDB, com R$ 92 milhões.
A compra de passagens para dirigentes ou membros de partidos políticos para o exterior não é proibida pela legislação eleitoral. Em geral, partidos podem utilizar recursos do fundo partidário para custear passagens de seus dirigentes e filiados para participarem de eventos político-partidários, como reuniões de comissões executivas, congressos e convenções partidárias.
Divulgação – 12.mai.2015/Facebook.com/presidentefhc
FHC recebe prêmio conferido pela Câmara de Comércio Brasil-EUA
A lei 9.096/95 (Lei dos Partidos Políticos), determina que os gastos relativos ao fundo partidário tenham vinculação com as atividades partidárias da legenda. A restrição é para evitar, por exemplo, que os recursos do fundo sejam utilizados em atividades particulares, como viagens turísticas.
A Câmara de Comércio Brasil-Estados Unidos de Nova York é uma organização não-governamental "independente e sem fins lucrativos" fundada em 1969 que, segundo seu próprio site na internet, tem a intenção de "promover o comércio e o fluxo de investimentos entre o Brasil e os Estados Unidos". Desde 1970, a entidade promove a entrega do prêmio "Personalidade do Ano". Questionada pelo UOL sobre a natureza do evento, a entidade informou que o prêmio não tinha nenhuma conotação "político-partidária".
Mesmo assim, o PSDB gastou R$ 20.042,67 para comprar as passagens de ida e volta para Aécio participar da homenagem a FHC. O valor consta das notas fiscais emitidas pela agência de turismo que expediu o bilhete para o partido. A fatura foi paga com recursos do fundo partidário.
O custo poderia ter sido reduzido pela metade. Isso porque o PSDB teve que remarcar as passagens de Aécio. Inicialmente, o partido gastou R$ 11.726,35 para comprar os bilhetes com saída do Aeroporto Internacional Tom Jobim, no Rio de Janeiro, no dia 10 de maio e retorno de Nova York no dia 17 de maio.
O partido, porém, acabou desembolsando mais R$ 8.316,32 para remarcar a passagem de ida. Em vez de deixar o Brasil no dia 7, Aécio partiu três dias depois, no dia 10.
Outro lado
A reportagem do UOL questionou o PSDB sobre: os motivos que levaram o partido a custear as passagens de Aécio para Nova York; se o senador havia sido convidado pelos organizadores do evento; como foi custeada a hospedagem dele na cidade norte-americana; se ele havia reembolsado o partido; se ele viajou a Nova York na companhia de assessores; e se eventuais assessores também tiveram suas despesas pagas pelo partido.
Por meio de nota, o PSDB disse que as viagens de dirigentes partidários custeadas pela legenda são realizadas "para atender interesses político-partidários".
Sobre a ida de Aécio a Nova York, o partido disse que a ida do tucano à cidade teve a missão de "representar" o partido. "O presidente do partido representou o PSDB em importante homenagem prestada ao seu presidente de honra". Segundo o partido, Aécio não viajou acompanhado por assessores.
Nesta quarta-feira (19), após a publicação desta reportagem, o PSDB enviou uma nova nota ao UOL em que diz que não há irregularidades na conduta do Aécio. "Nos últimos anos, poucos eventos internacionais trouxeram tanto prestígio ao partido quanto a homenagem prestada pela Câmara de Comércio Brasil-EUA que, em 2015, homenageou o ex-presidente norte-americano Bill Clinton e o presidente de honra do PSDB e ex-presidente da República Fernando Henrique Cardoso, que proferiu memorável palestra sobre a realidade brasileira e internacional para mais de mil convidados de diversas partes do mundo. Estranho seria se, em um evento dessa magnitude, o PSDB não se fizesse representar", diz o texto.
Reprodução: UOL