Brasil

Piloto confirma versão de Joesley sobre voo com Temer

Ex-funcionário de dono da JBS afirma que entregou pessoalmente buquê de flores a Marcela

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O piloto do voo que levou a família do então vice-presidente Michel Temer de Comandatuba, na Bahia, a São Paulo confirmou ao GLOBO a versão contada por Joesley Batista à Procuradoria-Geral da República (PGR) sobre o empréstimo do Learjet PR-JBS ao político, em janeiro de 2011. Piloto de avião há 33 anos, José de Oliveira Cerqueira, de 61 anos, disse ter entregado pessoalmente a Marcela Temer um buquê de flores em sua chegada à aeronave.

— Mandaram entregar as flores no avião. A própria empresa me orientou a informar que quem enviou foi dona Flora — disse o piloto, numa referência à matriarca da família Batista, mãe de Joesley.

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Cerqueira conta ter deixado de prestar serviços para a empresa naquele mesmo ano. Desde então, teria perdido contato com os antigos patrões da JBS.

Em nota oficial, Temer negou que soubesse quem era o proprietário da aeronave que o levou de São Paulo até o litoral baiano com a família, em 12 de janeiro de 2011 e, na tarde do mesmo dia, o levou até Brasília. O avião decolou dois dias depois de São Paulo rumo à Bahia, para buscar os parentes do então vice-presidente.

A versão de Temer contradiz o relato de Joesley, que contou aos procuradores ter recebido uma ligação do então vice-presidente perguntando sobre o envio de flores na aeronave e para agradecer pela gentileza, segundo fontes com acesso às investigações.

Cerqueira conta não ter sido informado previamente sobre quem seriam os passageiros do voo. Afirma que tem poucas lembranças, já que a viagem “aconteceu há mais de seis anos, isso é muito tempo”. O GLOBO perguntou, então, se tratou com os passageiros sobre temas relacionados aos donos da aeronave, mas ele disse não se lembrar.

— Sempre que tem um voo, nós tripulantes ficamos sabendo muito em cima da hora quem são os passageiros. Nesse, foi do mesmo jeito. Então, eu não posso afirmar o que o presidente e a família sabiam, o que se falou dentro do avião, porque a gente não tem esse acesso.

Cerqueira disse ter registrado no diário de bordo da aeronave os trechos percorridos e anotado também quem eram os passageiros. Documentos entregues à PGR pelos colaboradores da JBS trazem a anotação “Família sr. Michel Temer”, em viagens dos dois dias. O piloto conta ter se lembrado da história apenas nesta semana, depois que o caso veio à tona e foi publicado na imprensa.

— O que posso te dizer é que teve as flores. Não comprei, mandaram entregar lá. Fiz o que a empresa me mandou fazer. Isso tudo que o Joesley falou é verdade — afirmou o empresário.

Jato da JBS que o presidente Michel Temer teria usado, segundo delação de Joesley Batista – Reprodução internet / Agência O Globo

No retorno a Comandatuba para buscar a família de Temer e levá-la a São Paulo, o piloto diz ter reconhecido os familiares do então vice-presidente. Além de Marcela, o filho do casal, Michel Temer Filho, que na época estava perto de completar os dois anos de idade.

— Eu me lembro que era a família dele, mas não sei dizer quem eram as pessoas. Tinha a esposa dele e um filho pequeno, isso eu lembro — contou.

O GLOBO perguntou ao piloto se ele foi procurado nos últimos dias por integrantes da família Batista ou seus interlocutores, mas Cerqueira, que continua trabalhando como piloto de aeronaves, negou:

— Não tenho mais contato com eles.

O governo foi obrigado a se manifestar sobre o caso depois que Joesley contou à PGR sobre a viagem, como forma de demonstrar o nível de intimidade que tinha com Temer. O dono da JBS relatou que o envio de flores foi informado ao então vice-presidente, que não estava no voo, mas teria ficado com ciúmes. A empresa, então, teria orientado o piloto a dizer que este era um agrado da mãe de Joesley, e não do empresário. Joesley relatou ter recebido uma ligação de Temer para agradecer pelas flores. A assessoria do presidente sustenta que ele não teria realizado esta ligação.

Ao negociar acordo de colaboração com a PGR, no início do ano, o dono da JBS informou manter um relacionamento estreito com Temer desde 2010, quando teria sido apresentado a ele por Wagner Rossi, então ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (2010-2011). Na ocasião, Joesley teria passado a atender a pedidos de contribuições financeiras e favores do então vice-presidente. Em pronunciamento recente, Temer buscou se desvincular de qualquer relação de intimidade com Joesley, classificando-o como “conhecido falastrão”.

Detalhes sobre a o relacionamento dos dois foram relatados no anexo de número 9 da colaboração de executivos da empresa. Em 2010, ele teria solicitado a Joesley o pagamento de R$ 3 milhões em doações em caixa um e em caixa dois. “Quando Wagner Rossi deixou de ser ministro da Agricultura, Temer pediu a JB (Joesley Batista) que pagasse a ele (Rossi) mensalinho de R$ 100 mil (…) JB aquiesceu e determinou o pagamento, que foi feito dissimuladamente por cerca de um ano”, registrou a defesa de Joesley em documento do inquérito que investiga Temer. O presidente nega as acusações.

Há dois dias, O GLOBO perguntou à assessoria da Presidência da República para quem Temer pediu a aeronave particular; por que ele fez esse pedido; a convite de quem viajou; e quem o acompanhara no voo. O Planalto não se manifestou.

O Globo