Brasil

PF mira três contratos do Porto de Santos

Os investigadores apuram fraudes em licitações de serviço de digitalização de documentos, em contrato para aquisição de sistemas de informática no valor R$ 12 milhões

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A Operação Tritão, que prendeu o presidente da Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), José Alex Botelho de Oliva, nesta quarta-feira, 31, mira irregularidades em três contratos da estatal que administra o Porto de Santos. Os contratos somam R$ 37 milhões. Os investigadores apuram fraudes em licitações de serviço de digitalização de documentos, em contrato para aquisição de sistemas de informática no valor R$ 12 milhões e também pagamento indevido para a empresa de consultoria. A Polícia Federal prendeu Alex Oliva em sua casa no Rio por ordem do juiz Roberto Lemos dos Santos Filho, da 5.ª Vara Federal de Santos (SP). Os agentes também capturaram o ex-assessor da Presidência da Codesp Carlos Antonio de Souza, o Carlinhos, e outros cinco investigados pela PF, Controladoria-Geral da União, Tribunal de Contas da União, Receita e Ministério Público Federal.

“Os elementos de convicção coligidos, embasados em trabalhos realizados pela Controladoria-Geral da União e pelo Tribunal de Contas da União, indicam a ocorrência de conjunção de ideais, de esforços e de vontades entre os investigados para o cometimento de ilícitos, com o fim de obtenção de lucros fáceis e indevidos, em detrimento da Companhia Docas e da União”, afirmou o juiz. As suspeitas de irregularidades surgiram após um vídeo ser postado na internet em setembro de 2016. Nas imagens, Carlos Antonio de Souza ‘confessava a prática de diversos delitos ocorridos no âmbito daquela empresa’, dentre eles, fraudes em contrato de digitalização de documentos. O inquérito teve início em novembro de 2017 após o vídeo ser enviado pelo Ministério Público Federal à PF para investigação. O delegado da PF Victor Hugo Rodrigues Alves Ferreira, chefe da Delegacia de Repressão à Corrupção e Crimes Financeiros, afirma que ‘uma organização criminosa se instalou na Codesp’. Segundo o delegado, o objetivo do esquema era ‘fraudar contrato e licitações’.

“Depois de um ano de investigação, restaram comprovadas fraudes em ao menos três contratos: digitalização de documentos, mencionado no vídeo, um contrato de aquisição de software de uma empresa de Brasília e o aditivo de um contrato na área de consultoria também em informática. Os contratos que estão sendo investigados e auditados somam até o momento R$ 37 milhões”, relata o delegado. “É bem provável que esse valor seja maior porque as empresas que estão sendo investigadas possuem contratos com outros órgãos da administração pública. A exemplo da Secretaria de Portos e do Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes, o DNIT.” A investigação, segundo Victor Hugo, está embasada por provas documentais e testemunhais. O delegado narra que a PF ouviu o homem que filmou o ex-assessor da Presidência da Codesp.

A testemunha ‘confirmou que de fato se reuniu com as pessoas envolvidas, que tratavam abertamente da prática de crimes e licitações da Codesp’. “Ele acrescentou que depois que ele divulgou esse vídeo, ele foi procurado por alguns dos investigados, inclusive, um vereador da cidade do Guarujá, que lhe ofereceram US$ 200 mil para que ele não divulgasse o restante do vídeo. Ele chegou, inclusive, a receber, como parte do pagamento, um veículo de luxo”, relata. A investigação identificou ainda movimentações financeiras suspeitas de empresários investigados e também transferências que somaram R$ 154 mil a uma ex-dançarina do cantor Latino. Em 11 de abril de 2016, José Alex Botelho de Oliva nomeou a ex-Latinete Daniele Elise Rodrigues, de 22 anos, como assessora. “Uma das empresas envolvidas, os dois sócios, mediante triangulação de transferências bancárias acabaram transferindo R$ 150 mil para uma moça de 22 anos que é ex-dançarina do cantor Latino. Essa moça coincidentemente foi contratada como assessora do presidente da Codesp. Ela permaneceu por menos de uma semana no cargo, porque foi demitida em razão de pressão do sindicato dos servidores, que alegaram que ela não tinha a mínima qualificação para estar lá no cargo e que, além disso, prestava serviços da cidade dela, Laguna em Santa Catarina”, afirma o delegado. Chamou a atenção dos investigadores, a aquisição de mais de 100 licenças de softwares.

O Tribunal de Contas da União (TCU) identificou que não havia servidores capacitados a operar o software que estava sendo adquirido. “Das mais de 100 licenças, além de não ter ninguém que sabia operar, apenas 10 licenças estavam validadas. Ainda assim, a Codesp continuou adquirindo novas licenças a um custo superior a R$ 4 milhões”, aponta o delegado da PF.O secretário federal de Controle Interno Adjunto, Roberto Cesar de Oliveira Viégas, destaca as decisões tomadas no âmbito da Codesp, sobretudo, no que tange à sua área jurídica. Roberto Viégas vê ‘pareces jurídicos esotéricos, sem nenhuma fundamentação e documentação legal capaz de respaldar esses pagamentos’. Segundo o procurador-chefe do Ministério Público Federal, em São Paulo, Thiago Lacerda Nobre, está é ‘uma das maiores organizações criminosas em valores atuantes no Porto de Santos’. “Valores são absurdos e a prática deles beira ao escárnio com a população e com os órgãos de controle. Repasses de recursos, contratação de pessoas sem qualificação técnica mínima, aditivos em contratos, reequilíbrio econômico com parecer negativo”, aponta. “Existe uma verdadeira organização criminosa instalada no corpo da Codesp, voltada à prática dos mais diversos delitos, que simplesmente visa corroer o erário público, corroer o dinheiro público e desviar em proveito próprio. Temos elementos bastante robustos.” Nobre destaca que, embora tenha nascido ‘no seio da Codesp’, o esquema ‘já se espraiou para outros órgãos públicos’.

O procurador aponta que a contratação do software, ‘que a princípio não serve para nada ou para pouca coisa, não teria utilidade, segundo o TCU constatou, que já custou mais de R$ 12 milhões para a Codesp, esse software também foi contratado por outros órgãos públicos’. “Surpreendeu, analisando a atuação da organização criminosa, foi a desfaçatez de que ali estava parecendo que pouco se importavam em esconder os próprios rastros. O que parecia ali é que, verdadeiramente, havia um escárnio com a cara do contribuinte, do cidadão brasileiro, desviando recursos sem se preocupar sequer em esconder os próprios rastros”, relata. A acusação formal contra a cúpula das Docas deverá chegar rapidamentre à Justiça Federal. “Existem elementos bastante construídos para um futuro oferecimento de denúncia”, prevê Lacerda.

Estadão // AO