Morreu às 23h30m desta quinta-feira, aos 89 anos, o crítico de teatro, jornalista e professor Sábato Magaldi. Membro da Academia Brasileira de Letras, ele estava internado desde o dia 2 de julho no Hospital Samaritano, em São Paulo, com problemas pulmonares. Não foi informada a causa da morte.
Sábato era um dos mais importantes críticos e estudiosos do teatro. Autor de clássicos como "Panorama do teatro brasileiro", importante historiografia que começa em Anchieta e chega a meados do século XX, ele entrou para a Academia Brasileira de Letras em 1995 e ocupava a cadeira 24, que já foi de Manuel Bandeira.
Magaldi foi um dos primeiros professores da Escola de Comunicações e Artes da USP e era um dos maiores especialistas na obra de Nelson Rodrigues.
Em obras fundamentais como "Panorama do teatro brasileiro" (1962) e "Moderna dramaturgia brasileira" (1998), Sábato destrinchou, exercendo a dupla função de crítico e pesquisador, as obras completas de Nelson Rodrigues (1912-1980) e de Jorge Andrade (1922-1984). E, se hoje a obra de Nelson é mais bem compreendida, foi Sábato o responsável por isso. Foi ele quem segmentou suas 17 obras em grupos: "peças psicológicas", "peças míticas" e "tragédias cariocas". Debruçou-se como poucos sobre a obra de Nelson, e sua contribuição foi fundamental para que a dramaturgia do dramaturgo ultrapassasse a dimensão do sucesso popular e se tornasse objeto de estudo e pesquisa acadêmica.
Sábato Antônio Magaldi nasceu em Belo Horizonte (MG), em 9 de maio de 1927, e formou-se em Direito em 1949, aos 22 anos. Em 1950, logo após receber o diploma, desistiu da carreira e estreou nas páginas de crítica do "Diário Carioca", levado pelo amigo Paulo Mendes Campos, que achava o ofício “cacetíssimo”.
O pesquisador acabou ficando pouco tempo no jornal, pois achava necessário ampliar seu conhecimento sobre teoria teatral. Em 1952, deixou o Brasil e foi à França estudar com Étienne Souriau, mas acabou ficando pouco tempo. Em Paris, obteve o certificado de Estética da Sorbonne, em 1953, e logo recebeu o convite de Alfredo Mesquita para se tornar professor da recém-criada Escola de Artes Dramáticas (EAD) da USP, onde passou a dar aulas de teatro brasileiro e ajudou a formar alunos como Glória Menezes, Juca de Oliveira e Ney Latorraca. Contemporâneo de nomes como Décio de Almeida Prado (1917-2000), Anatol Rosenfeld (1912-1973) e Jacob Guinsburg, anos mais tarde Sábato foi eleito para Academia Brasileira de Letras. Tomou posse, como imortal, em 1995, ocupando a cadeira 24, a mesma de Manuel Bandeira e Ciro dos Anjos.
Tido como o primeiro "jornalista de teatro" da imprensa brasileira, Sábato atuou como crítico de "O Estado de S. Paulo" e "Jornal da Tarde", entre 1956 e 1988 e, mesmo tendo sido considerado por Nelson "o melhor crítico do Brasil", fazia questão de evitar o olhar de cima para baixo e, sobretudo, o distanciamento que, por vezes, marca a relação entre críticos e artistas.
"Não vejo o crítico como alguém distante, com postura olímpica em relação ao trabalho teatral", disse ele em depoimento concedido ao Serviço Nacional de Teatro, em 1978. "Pelo contrário, nunca me senti dissociado da classe e sempre procurei realizar um trabalho construtivo. Aliás, é importante notar que não escrevo para o ator: escrevo é para o público."
Seus livros, que reuniram críticas, artigos e ensaios, possibilitam um passeio por mais de um século de teatro, com foco no panorama do Brasil, partindo do longínquo José de Anchieta aos românticos, e destes aos artistas e autores que ajudaram a delinear o século XX. Escreveu sobre a mítica estreia de "Vestido de noiva" (1943), de Nelson Rodrigues, sob a direção de Ziembinski, considerado um dos marcos do teatro moderno brasileiro, mas fez questão de ressaltar que a hegemonia do "autor brasileiro" não se deu com Nelson, mas com "Eles não usam black-tie", de Gianfrancesco Guarnieri.
Investigou em pormenores a obra teatral e antropofágica de Oswald de Andrade, assim como dedicou atenção a Oduvaldo Vianna Filho e a Plínio Marcos — em relação a Plínio, seus textos serviram de base a manifestos contra a censura das peças "Navalha na carne" e "Abajur lilás", proibidas durante a ditadura militar. Nos anos 1970, acompanhou a eclosão de um novo momento do teatro brasileiro, a fase dos encenadores, sedimentada por montagens de Antunes Filhos, como "Macunaíma" (1978), e muitas outras de José Celso Martinez Corrêa. Com o fundador do Teatro Oficina, Sábato entrou em conflito, e ambos produziram uma extensa e virulenta polêmica literária, com críticas, réplicas e tréplicas escritas a partir de sua avaliação negativa para "Gracias, señor" (1972).
Além do vasto material publicado, Sábato construiu nas últimas cinco décadas um grande acervo que ainda permanece inédito. Em seu apartamento em São Paulo, o crítico deixou cerca de 50 cadernos de anotações pessoais sobre espetáculos e artistas diversos. O autor iniciou os seus diários do teatro brasileiro em 1966, mas manteve firme o propósito de nunca publicá-los. Os cadernos são tão pessoais que não foram lidos nem por sua mulher, a escritora Edla Van Steen, que deverá manter a vontade do autor de só publicar os cadernos 30 anos após sua morte.
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