Investigadores da Operação Lava Jato preveem que boa parte do conteúdo das delações da Odebrecht seja tornada pública na primeira quinzena de fevereiro. A expectativa é de que o ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Teori Zavascki, a pedido do procurador-geral da República, Rodrigo Janot, retire o sigilo da maioria dos cerca de 900 depoimentos tão logo as colaborações sejam homologadas. Isso deve ocorrer após o fim do recesso do Judiciário, no próximo mês. Uma pequena parte do material, no entanto, deverá ser mantida em sigilo para não comprometer o aprofundamento das investigações. A divulgação dos relatos de 77 delatores ligados à empresa causa apreensão no mundo político, que deve ser diretamente atingido pelas apurações. Como relator da Lava Jato no Supremo, cabe a Teori validar as delações. Para isso, uma equipe de auxiliares do ministro analisa todo o material durante o recesso. Os acordos são resultado de uma longa negociação, que se estendeu durante quase todo o ano de 2016. Nos depoimentos, que serão divulgados em formato de áudio e vídeo, sem transcrições, os delatores relatam propina para políticos e operadores no Brasil e fora do País em troca de contratos de obras públicas, além do uso de contas e empresas no exterior para viabilizar os pagamentos ilícitos. Segundo pessoas com acesso aos depoimentos, aliados próximos ao presidente Michel Temer serão diretamente atingidos pelas delações dos executivos e ex-executivos da empresa, o que deve trazer turbulência política para o governo. Antes mesmo de a delação ser homologada, Temer já sofreu baixas na equipe. Em dezembro, quando o teor do depoimento do ex-diretor de Relações Institucionais da empreiteira Cláudio Melo Filho foi conhecido, o então assessor especial da Presidência José Yunes, amigo de Temer há 50 anos, deixou o governo. Ele foi acusado pelo delator de receber dinheiro em seu escritório em São Paulo em 2014. Yunes nega a informação e diz que nunca teve contato com Melo Filho.
Próximas fases. Após a homologação dos acordos e divulgação do conteúdo, a Procuradoria-Geral da República e a força-tarefa da Lava Jato podem realizar operações e solicitar diligências, como quebra de sigi-
Cláudio Melo Filho O ex-diretor de Relações Institucionais da Odebrecht disse que o presidente Michel Temer pediu “apoio financeiro” às campanhas do PMDB em 2014 a Marcelo Odebrecht, que se comprometeu a pagar R$ 10 milhões. O delator citou ainda outros peemedebistas e políticos de diversos partidos. Temer repudiou o que chamou de “falsas acusações”.
Paulo Cesena O ex-presidente da Odebrecht Transport afirmou em delação que o ministro da Ciência, Tecnologia e Comunicações, Gilberto Kassab (PSD), recebeu R$ 14 milhões da empresa, em 2013 e 2014, via caixa 2. O secretário do Programa de Parceria de Investimentos, Moreira Franco (PMDB),
los bancário e telefônico de pessoas investigadas.
A previsão é de que o processo de investigação ligado à Odebrecht seja longo, com a distribuição de trabalhos em vários Estados. Isso porque, segundo a empreiteira, o pagamento de propina envolveu obras federais, estaduais e municipais. Por isso, a apuração não ficará concentrada em Brasília ou Curitiba.
Um dos depoimentos tidos como cruciais para os investigadores é o de Marcelo Odebrecht, herdeiro do grupo e ex-presi- e o deputado cassado Eduardo Cunha (PMDB-RJ) também foram citados. Moreira Franco afirma que “jamais” conversou com Cesena “sobre temas partidários”. Kassab disse desconhecer doação ilegal à sua campanha. A defesa de Cunha não comentou.
Leandro Azevedo A delação do ex-superintendente da Odebrecht no Rio envolve no-
Colaborações mes das principais lideranças políticas do Estado. Azevedo relatou doações de caixa 2 para o governador Luiz Fernando Pezão (PMDB), o ex-prefeito Eduardo Paes (PMDB), o senador Lindbergh Farias (PT) e o ex-governador Anthony Garotinho e sua mulher, Rosinha, ambos do PR. Os citados negaram irregularidades e criticaram o que chamaram de “vazamentos seletivos”.
Márcio Faria O ex-presidente da Odebrecht Engenharia Industrial relatou que Temer e Cunha pediram recursos à campanha de 2010. Temer confirmou reunião com Cunha e um empresário que, segundo ele, “pode ser” Faria. A defesa de Cunha disse não ter tido acesso ao teor da delação.
mentos é de que a delação da Odebrecht é politicamente “democrática”. Ou seja, atinge líderes e siglas de diferentes polos da política nacional.
Em dezembro, o vazamento de um anexo da delação de Melo Filho mostrou que senadores, deputados e ministros mantiveram relações com a empresa – seja por troca de favores, seja ao receber valores para atuar em benefício da Odebrecht.
As colaborações do grupo vão gerar “recalls” em acordos da Camargo Corrêa e da Andrade Gutierrez. Segundo investigadores, diante das extensas revelações da Odebrecht, as duas outras empreiteiras terão de complementar os acordos feitos anteriormente, sob risco de terem os benefícios acertados com o Ministério Público invalidados
Reprodução: O Estado de São Paulo