Bahia

Obras da Prefeitura mudam característica de Salvador: de arborizada para "cidade de concreto"

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Otávio Santos/Secom PMS
Otávio Santos/Secom PMS

No mês em que é celebrado o Dia da Árvore, em 21 de setembro – a data comemorativa foi escolhida por anteceder o início da primavera no Hemisfério Sul -, a capital baiana não tem lá muitos motivos para celebrar o período. Nas várias requalificações pelas quais a cidade vem passando nos últimos tempos, além da redesenho de diversas partes do município, chama a atenção o fato de não haver a preservação da vegetação existente nesses locais, tornando Salvador, antes com trechos com extenso verde, em uma verdadeira cidade de concreto.

Um dos exemplos mais emblemáticos é o da orla da Barra, onde a queixa é constante sobre a ausência de árvores para se abrigar em dias de forte calor. No entanto, nada é mais evidente nessa questão, entre as intervenções realizadas na cidade, do que a referente ao BRT, sistema de transporte considerado ultrapassado por muitos especialistas do setor, mas que a Prefeitura fez questão de levar adiante. Ao todo o sistema é composto por três trechos, sendo que dois estão em funcionamento: o trecho 1, que vai da região do Iguatemi até o Cidade Jardim, e o trecho 3, que começa no Cidade Jardim e vai até o Itaigara.

O trecho 2, considerado o maior do sistema e que ainda está com as obras em andamento, vai do Cidade Jardim até a Estação da Lapa. A expectativa é a de que seja entregue no início de 2024. Contudo, o investimento, apenas nestre trecho, é superior aos R$ 210 milhões. Acrescentada nesta conta os mais de R$ 280 milhões referentes aos trechos 1 e 3, a obra do modal tem o custo de quase R$ 500 milhões. Os números relativos aos investimentos feitos nos dois trechos, separadamente, foram divulgados pela própria Prefeitura de Salvador.

As intervenções foram iniciadas na gestão do ex-prefeito ACM Neto (União Brasil) e tiveram continuidade na administração do prefeito Bruno Reis (União Brasil). Para a execução especialmente das intervenções no 2º trecho do sistema, para a construção de pistas, elevados e pontes, foi preciso eliminar boa parte da vegetação existente no trecho entre o Parque da Cidade e o cruzamento entre as avenidas Vasco da Gama e Garibaldi. Mesmo com os protestos por parte de órgãos ambientais e população, as obras seguem em frente.

“A vegetação suprimida fazia parte do patrimônio urbanístico e paisagístico de Salvador. Eram árvores centenárias que deveriam ser preservadas, tendo em vista seu valor histórico e ambiental. Além disso, no projeto do BRT foi embutida a construção de faixas para automóveis individuais, o que, além de encarecer a obra, demandou uma área de intervenção muito extensa”, aponta o ambientalista Thiago Brasileiro, em entrevista ao Portal Salvador FM.

ALTERNATIVA

Diante da necessidade de supressão da vegetação nos locais onde ocorreram as intervenções do BRT, a Prefeitura determinou uma espécie de “compensação”, com o plantio, segundo a Secretaria municipal de Mobilidade Urbana (Semob), responspável pela administração do sistema, de mais 10 mil mudas, “em sua maioria no corredor do BRT, assim como em outros locais da cidade”, diz uma nota da pasta enviada ao Portal Salvador FM.

“Houve uma compensação para o trecho onde passa o BRT, entretanto, outros locais da cidade vêm recebendo mudas após requalificações de vias com o objetivo de arborizar não apenas o trecho construído, mas a cidade como um todo. O plantio das árvores é parte do contrato com as empresas que estão executando as obras, prevista em projeto urbanístico, e portanto não sai recurso direto da Prefeitura para este plantio”, afirmou a secretaria.

“A questão não é apenas plantar mais árvores, mas passa também por contratos adequados para que as mudas plantadas vinguem, cresçam e enriqueçam o conjunto paisagístico e a biodiversidade da cidade. No caso do BRT, acho que deveria-se priorizar a preservação das árvores centenárias (…) Eu pessoalmente não participei de nenhuma audiência, mas soube, através de outras pessoas, que a comunicação da Prefeitura em relação ao projeto, foi insuficiente”, rebate Tiago Brasileiro.

Outra questão que pode ser levada em consideração, diante ainda da supressão da vegetação, é a quantidade de pessoas que o sistema vem transportando. De acordo com dados recentes da própria Prefeitura de Salvador, o BRT já transportou mais de 600 mil pessoas. No entanto, a impressão é que, ao passar pelas estações, é a de que os dados não representam a realidade, uma vez que é comum ver os locais vazios, com pouca movimentação de passgeiros.

Para Thiago Brasileiro, independente de obras como a do BRT, a cidade deve ser cada vez mais arborizada, com escolha por espécies adequadas a cada situação, mediante projetos paisagísticos. Porém, segundo ele, o sistema interviu demasiadamente no cenário das regiões afetadas, dando prioridade o automóvel individual, em detrimento do transporte coletivo. “[…] Tendo em vista que cerca de 40% do orçamento da obra foram utilizados na estrutura específica do BRT, enquanto que 60% foram utilizados nas pistas para automóvel individual”, pontuou.