A mãe de João Guilherme Matos, o garoto de 10 anos que foi picado por uma cobra durante uma trilha no município baiano de Ibicoara na região da Chapada Diamantina, na Bahia, reclama de uma suposta negligência médica no atendimento feito à criança, no posto de saúde da cidade. Apesar da situação, João Guilherme já está melhor, saiu da UTI, e até brincou com o próprio estado de saúde. "Firme e forte. De boa na lagoa", disse o menino. Ele voltou a enxergar e a ter o movimento das pernas. Ainda não há uma data definida para alta do garoto, e a família cearense planeja voltar para a Bahia a passeio.
Erile Matos, mãe da criança, contou que mesmo com os sintomas da picada da cobra, o médico não aplicou o soro antiofídico. "Em Ibicoara ele foi medicado, mas apresentou os primeiros sintomas. Ele reclamava que não estava me enxergando, depois começaram as dores no corpo e a falta de ar. Então eu questionei com o médico porque ele não daria o soro [antiofídico]. Ele deu um antialérgico e justificou que Guilherme [o filho] não apresentava sintomas referentes à picada de cobra, ao veneno", disse a mãe Erilene Matos.
De acordo com Erilene, ela ainda perguntou ao médico sobre os sintomas do filho como a falta de ar, dor no corpo e a perda da visão. "Ele [o médico] disse que esses sintomas eram por conta da medicação que o Guilherme estava tomando, o antialérgico. Eu pedi pelo amor de Deus que ele o medicasse, colocasse o soro e ele disse que não ia fazer porque tinha todo o protocolo que ele tinha que seguir e, na visão dele, a cobra não tinha injetado o veneno, porque a picada foi só com uma das presas. Eu acho que foi negligência, se ele [o médico] tinha dúvida, ele deveria ter ligado para o órgão que fornece o soro", relatou .
Hugo Luz, o médico que atendeu João Guilherme disse que ele chegou sem os sintomas na unidade de saúde e por precaução não aplicou o soro. "Em momento algum fui negligente e tenho testemunhas na unidade. Eu sigo protocolos, sempre entro em contato com o Instituto Butantan, em São Paulo, quando recebo pacientes que foram picados por animais peçonhentos. E o que eles indicam é que se o paciente não apresenta sintomas é que a gente aguarde e deixe o paciente em observação", disse.
Luz ainda relatou que o menino ficou por sete horas na unidade de saúde em observação e que só depois que recebeu alta, foi que apresentou os sintomas. "A mãe me questionou sobre a aplicação do soro e eu disse que não iria fazer porque ele não estava apresentando manifestação nenhuma, se eu aplicasse e a criança tivesse uma reação, eu não teria um suporte aqui [para dar socorro], então eu preferi deixar a criança em observação para ver. Se apresentasse algo de imediato, eu daria o soro e foi o que aconteceu", disse.
Conforme o médico, quando a criança voltou pela segunda vez à unidade de saúde, ele fez o exame completo, checou as pupilas e viu que elas estavam dilatadas. "Imediatamente administrei o soro e já fiz o caminhamento para o hospital especializado em Barra da Estiva. No encaminhamento, solicitei completar o esquema de soroterapia e, se possível, transferir o paciente para um centro de referência de alta complexidade", contou Luz.
Para Daniel Rebouças, diretor do Centro Anti Veneno (Ciav), em Salvador, o quadro inicial de picada por cascavel é um pouco lento e os sintomas não aparecem de imediato, o que dificulta o diagnóstico inicial e o quadro clínico se instala aos poucos.
O diretor do Ciav também recomenda que as pessoas que forem picadas por animais peçonhentos lave o local com água limpa e sabão. "A gente também orienta que ocorrendo um acidente, a pessoa deve ser levada [para uma unidade de saúde] para que o veneno inoculado não circule tão rapidamente pelo corpo. É errado amarrar, furar, cortar, sugar o local da picada e passar qualquer coisa em cima que não seja água e sabão. É necessário o uso do soro para cada tipo de serpente", explicou.
Foto: Reprodução/G1