Bahia

'Foi difícil foi ver os corpos', diz carpinteiro que ajudou no resgate de vítimas de tragédia com lancha na Bahia

Ao menos 18 pessoas morreram após lancha com 120 pessoas virar na Baía de Todos-os-Santos. Buscas por possíveis vítimas foram retomadas nesta sexta.

NULL
NULL

Um colega passou aqui de barco e perguntou quem queria ajudar, eu nem pensei e entrei no barco", é o que conta o carpinteiro Juarez dos Anjos Silva, de 44 anos, que auxiliou no resgate das vítimas da tragédia com uma embarcação na Baía de Todos-os-Santos, em Vera Cruz, região metropolitana de Salvador. Ao menos 18 pessoas morreram no acidente. Outras possíveis vítimas são procuradas nesta sexta-feira (25),embora não haja relatos de pessoas desaparecidas, informou a Marinha.

Nesta manhã, Juarez voltou à praia da Gamboa, local para onde parte das vítimas foi levada ao ser retirada do mar. No local, ainda é possível ver uma lona preta, usado para cobrir os corpos resgatados logo após o acidente, além de um pequeno pedaço da embarcação.

O carpinteiro conta que tem o costume de ir à praia pela manhã para olhar o mar, mas na quinta-feira (24), o que ele viu da areia foram as pessoas em cima do barco, pedindo socorro. "O colega passou aqui é a gente via o pessoal em cima do barco. Quando entramos no mar começamos a trazer os sobreviventes. Olhamos o barco inteiro. Foi difícil ver aqueles corpos espalhados. A gente fica traumatizado", relatou.

Juarez conta que conseguiu levar para a areia, ao menos, seis pessoas vivas e ajudou a resgatar nove mortos. "Nossa cidade está em luto. Estou aqui desde que nasci, há 43 anos e nunca vi uma tragédia dessa", lamentou.

Tragédia

A lancha Cavalo Marinho I virou por volta das 6h30 de quinta-feira, cerca de 10 minutos após deixar o Terminal Marítimo de Mar Grande, que fica no município de Vera Cruz, localizado na Ilha de Itaparica. A embarcação tinha como destino Salvador e estava a aproximadamente 200 metros da costa quando o acidente aconteceu. A viagem dura aproximadamente 45 minutos.

Até agora, 11 pessoas que morreram no acidente haviam sido identificadas. Além de uma criança de 2 anos, de iniciais D.Q.R.J, foram identificados dois homens, de 67 e 35 anos, e oito mulheres, uma de 50 anos e as outras de idade não informada. Os corpos foram periciados no Departamento de Perícia Técnica (DPT) de Salvador e na unidade de Santo Antônio de Jesus.

Outras três crianças morreram no acidente. Um deles é Davi Gabriel Monteiro Coutinho, que viajava com a mãe, a irmã, de 5 anos, e a avó, segundo relato de familiares. Só o menino não se salvou. Uma criança de 1 ano que chegou a ser resgatada com sinais vitais morreu em uma ambulância do Samu. O outro é Darlan Queiroz, de dois anos, que foi retirado do mar pelo próprio pai. O menino viajava com a mãe e a avó, que também morreram na tragédia.

A Secretaria de Saúde da Bahia (Sesab) informou que 89 pessoas haviam sido resgatadas com vida. Dentre os sobreviventes resgatados, 70 foram na Unidade de Pronto Atendimento (UPA), em Mar Grande; 15 foram para o Hospital Geral de Itaparica; dois estiveram no Hospital do Subúrbio e dois no Hospital Geral do Estado (HGE), ambos em Salvador.

Em nota, a CL Transportes, dona da embarcação Cavalo Marinho I, lamentou a tragédia e se solidarizou com as vítimas do acidente, além de reforçar que a embarcação estava regular, com todas as vistorias em dia. A empresa informou, ainda, que presta assistência às famílias das vítimas com uma equipe formada por médicos, pscólogos e assistentes sociais.

Mau tempo

O mau tempo e a desestabilização da lancha pode ter provocado o acidente com a lancha. Segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), a velocidade do vento, que normalmente é de 7 km/h, era de cerca de 31km/h no local do acidente, quando a embarcação virou.

Conforme relato de sobreviventes, por causa da chuva forte e do vento, os passageiros da lancha passaram para um lado só da embarcação, o que teria provocado a desestabilização da lancha, que virou após ser atingida por uma onda.

A Marinha informou que vai ouvir os sobreviventes durante as investigações para apurar se isso provocou o acidente. De acordo com a Capitania dos Portos, as causas, circunstâncias e responsabilidades do acidente já começaram a ser apuradas. O inquérito deve ser concluído em 90 dias.

"Informação do que efetivamente ocorreu nós só teremos ao final do inquérito que está sendo instaurado pela Marinha para apurar o acidente. Nós ouviremos testemunhas, a embarcação vai passar por uma perícia e, ao final do inquérito, que tem prazo de conclusão de 90 dias, é que nós teremos um quadro efetivo”, afirmou o comandante Flávio Almeida, assessor de relações institucionais da Marinha na Bahia.

Ainda segundo o comandante Flávio, o Centro de Hidrografia da Marinha emite boletins meteorológicos duas vezes por dia, sobre as condições do mar, altura das ondas, velocidade dos ventos. O informativo é enviado para a imprensa, marinas e colônias de pescadores. Mas, conforme a Capitania dos Portos, a orientação é que os navegantes consultem as condições do mar antes de sair.

Quando há aviso de mau tempo, esclarece a Marinha, o responsável pela embarcação é quem decide se tem condições ou não de navegar. Na quinta-feira, quando ocorreu o acidente com a lancha, não havia alerta de mau tempo na área de todo litoral baiano, informou o comandante Flávio Almeida.

Em nota, o Ministério Público do Estado da Bahia informou que um promotor de Justiça será designado para acompanhar de perto a apuração dos fatos que motivaram o acidente. O MP-BA disse ainda que a condição de "precariedade" do serviço de transporte realizado pelas embarcações foi alertada há mais de dez anos pela promotoria, que propôs ações civis públicas nos anos de 2007 e 2014 sobre o caso.

Na primeira ação, o Ministério Público alertou sobre inúmeras irregularidades no transporte de passageiros pelas embarcações, que colocariam em risco, diariamente, a segurança de centenas de pessoas. Em 2014, em uma nova ação civil pública, o MP-BA solicitou a reforma dos terminais e das embarcações, a renovação dos coletes salva-vidas e outras medidas que assegurassem a saúde e segurança dos usuários. As ações propostas pelo Ministério Público ainda aguardam decisão judicial.

Fonte: G1