A Defensoria Pública do Estado da Bahia deverá recorrer até o Supremo Tribunal Federal (STF) para que a Súmula Vinculante 56 seja aplicada aos presos que cumprem pena em regime semiaberto no Conjunto Penal de Feira de Santana. Desde agosto, a unidade prisional está envolvida em um imbróglio, com uso de medidas jurídicas inadequadas para o caso, com interdição e desinterdição, que culminaram com a liberação de quase 270 presos do regime semiaberto para prisão domiciliar. A Defensoria Pública ainda vai definir os remédios jurídicos que deverão ser adotados, mas o certo é que busquem todas as instâncias necessárias para garantir a aplicação da Súmula enquanto a situação do Conjunto Penal de Feira de Santana não é resolvida pelo Estado.
A Súmula Vinculante 56 do STF prevê que “a falta de estabelecimento penal adequado não autoriza a manutenção do condenado em regime prisional mais gravoso”, e, assim, o juiz da Vara de Execução Penal poderá converter a prisão em domiciliar. O entendimento do Supremo foi tomado diante da impossibilidade de alguém cumprir uma pena mais grave da que lhe foi imposta. Em Feira, por conta da falta de vagas e estruturas para o regime semiaberto, os presos acabavam ficando em locais e condições para cumprimento de penas praticamente idênticas aos do regime fechado. Entre os problemas elencados estão a falta de vagas para o exercício de atividades laborativas e/ou educativas. Também não há fornecimento de um quantitativo de vagas pelo Poder Público. A defensora pública Helaine Pimentel ressalta que, a “par de todos os esforços que os presos possam despender, objetivando qualificar-se e ocupar-se por meio do estudo e do trabalho, sabe-se que a conjuntura atual do sistema carcerário do Conjunto Penal de Feira não favorece tal empenho”.
De acordo com a defensora, “manter a parametrização da decisão, garantindo o funcionamento regular do Conjunto Penal ” não implica que a Vara da Execução Penal deve “inobservar os princípios constitucionais, mormente o da dignidade da pessoa humana, que, dentro desta matéria, reforça que o apenado deve ser tratado, acima de tudo, como pessoa humana, digna de um tratamento que atenda às suas necessidades básicas, ao mesmo tempo que cumpre a pena prevista, no regime que lhe foi imposto".
Ela explica, ainda, que a decisão tomada pelo presidente do Tribunal de Justiça da Bahia (TJ-BA), desembargador Gesivaldo Britto, suspendeu os efeitos das conversões de regime semiaberto para o domiciliar, atendendo ao pedido da Procuradoria Geral do Estado (PGE) para estender os efeitos da suspensão de liminar que desinterditou o presídio em agosto deste ano.
A defensora explica que o pedido da PGE feito em agosto versava se o presídio poderia voltar a receber presos de outras cidades. O Conjunto Penal foi interditado em abril deste ano, para não receber mais presos, pois o Estado da Bahia havia descumprido um acordo celebrado com o Ministério Público da Bahia (MP-BA). O pedido da PGE foi acatado pelo TJ-BA, que permitiu o ingresso de novos presos na unidade, que já se encontrava com superlotação excedente de quase 600 presos. Quando foi permitida a desinterdição, o MP-BA interpôs um agravo impugnando a ação. Esse agravo ainda não foi analisado pelo TJ-BA. Logo depois, o MP ajuizou uma Reclamação Constitucional, pedindo para manter a desinterdição e que as conversões para a prisão domiciliar fossem suspensas. Essa reclamação deve ser julgada em sessão plenária do TJ, com reunião de todos os desembargadores.
Segundo a defensora, não se pode esperar o TJ-BA “se manifestar sobre a reclamação constitucional”. A Defensoria Pública já pediu a participação no julgamento na qualidade de amicus curiae. O pedido de amicus curiae ainda não foi analisado pelo TJ-BA. O andamento da reclamação está parado. “Na minha visão, temos que levar essa situação para todas as instâncias”, pontuou. Para o retorno dos detentos para o regime semiaberto, poucas medidas foram adotadas pelo Estado. Os que retornarão, deverão ficar em pavilhões com a mesma estrutura física. A diferença é que o Estado, agora, começa a separar os presos provisórios dos sentenciados e os do regime fechado do semiaberto. Atualmente, a unidade tem cerca de 1,7 mil presos. A capacidade total é para 1,3 mil detentos. Em agosto, antes das dispensas exaradas pelo juiz Waldir Viana, da Vara de Execuções Penais, o número de detentos chegava a quase 1,9 mil.
No regime semiaberto, os detentos têm direito às saídas temporárias, ao trabalho e ao estudo, devendo recolherem-se à noite, sendo que apenas 40 exerciam o trabalho. A principal queixa dos apenados do regime semiaberto é a falta de oportunidades de trabalho. “Em um centro industrial com mais de 160 empresas, poder-se-ia ter envidado esforços para firmar convênios com outras empresas do CIS, pois havendo uma oferta maior de vagas, praticamente todos do regime semiaberto poderiam estar trabalhando”, destaca a defensora. A estrutura física é praticamente a mesma, a quantidade de vagas para trabalho e para as atividades educativas são as mesmas. Em conjunto com o MP e com o TJ, a Defensoria realiza inspeções mensais na unidade e observa-se as principais reclamações dos presos. Dentre os problemas estão a superlotação carcerária e a falta de condições oferecidas pelo estabelecimento adequado ao cumprimento de pena em regime semiaberto.
O pedido para suspensão dos efeitos da decisão do juiz da Vara de Execuções Penais foi baseado em um suposto risco para sociedade com a conversão para o regime domiciliar, sem monitoramento eletrônico. A defensora Helaine Pimentel afirma que, desde que os detentos puderam cumprir a pena em regime albergue domiciliar, não houve relatados de aumento de indíce de violência relacionado a tais conversões. “Ressalte-se a atenção que a maioria denota ao procurar ao órgão defensorial para informar e atualizar dados pessoais, bem como para dirimir dúvidas quanto as condições impostas para o cumprimento da prisão domiciliar”, informa.
Bn // AO