A Defensoria Pública do Estado da Bahia (DPE/BA) e o movimento negro Reaja ou Será Morto, Reaja ou Será Morta, realizam na segunda-feira (20), às 9h, uma audiência pública para debater ação da Polícia Militar que resultou em 12 mortes e seis feridos no bairro do Cabula, em Salvador, em fevereiro de 2015. A audiência será na Escola Superior da Defensoria Pública da Bahia (Esdep), localizada na, na Rua Pedro Lessa, no bairro do Canela. Após o imbróglio processual, com a absolvição dos nove policiais militares envolvidos na operação, o procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu ao Superior Tribunal de Justiça (STJ), em 2016, que apure a ação. Ele destacou que houve "incongruências" nas investigações e "fatos que causam estranhamento".
O procurador propôs deslocamento de competência (federalização) para que o caso vá para o STJ por entender que "ao absolver sumariamente os policiais militares envolvidos, sem permitir que o andamento normal do processo ocorresse, a Justiça Estadual não levou em conta informações importantes que poderiam levar a um resultado diferente, o que demonstra a necessidade de a Justiça Federal assumir as investigações". A OAB Nacional também já havia formulado pedido ao MPF para envio do caso à Justiça Federal. O processo está parado no Superior Tribunal de Justiça (STJ) há quase um ano.
Deslocamento de competência
Conforme a Procuradoria, o deslocamento de competência é possível quando há requisitos de grave violação de direitos humanos, risco de responsabilização internacional pelo descumprimento de obrigações assumidas em tratados internacionais e evidência de que órgãos do sistema estadual não mostram condições de seguir no desempenho da função de apuração, processamento e julgamento do caso.
No pedido ao STF, Janot destacou que o caso do Cabula foi tema de representação formulada pela ONG Justiça Global à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, com relato de ameaças sofridas por integrantes da campanha "Reaja ou Será Morta, Reaja ou Será Morto", conhecida pela atuação contra a violência policial na Bahia e que também destaca o caso do Cabula.
Para Janot, o caso em análise “traz indícios fortes – que merecem apuração adequada – de que agentes do Estado promoveram verdadeira execução, sem chance de defesa das vítimas, o que configura hipótese de grave violação de direitos humanos, a exigir pronta atuação dos poderes constituídos do Estado brasileiro, especialmente no âmbito da União, no sentido de restaurar o Estado de Direito na região”.
De acordo com a PGR, foram 143 disparos, 88 deles certeiros, o que resulta em média de quase 10 tiros certos por acusado. Os mortos tinham entre 15 e 28 anos de idade. Conforme o procurador, há registro de inúmeros ferimentos causados por disparos deflagrados de trás para frente – com as vítimas de costas – e de cima para baixo, além de vários nos braços e mãos, com características de posição de defesa, segundo os laudos cadavéricos insetidos no inquérito. Na ação, um dos PMs também foi baleado de raspão na cabeça.
Ainda conforme o procurador-geral, os fatos em exame podem gerar a responsabilização do Brasil nos foros internacionais de proteção dos direitos humanos. “Houve parcialidade ou, ao menos, complacência com apurações favoráveis aos agentes da polícia, com indícios de que partiram com ponto de destino certo, não sem se desqualificar as vítimas, seja no curso do trabalho de apuração, seja na sentença”, comentou.
Versão da PM-BA
Segundo a PM, as 12 pessoas foram mortas durante confronto com agentes das Rondas Especiais (Rondesp). Conforme os policiais, tiroteio aconteceu após eles terem recebido a informação de que um grupo planejava roubar um banco no bairro do Cabula.
A PM afirma que, ao chegar ao local, a polícia encontrou seis homens de mochilas, o que despertou desconfiança inicial. Durante perseguição, a polícia conta que os suspeitos correram para um local onde estavam mais 30 homens, que teriam iniciado o tiroteio.
Na ação, a PM diz que foram apreendidos com os suspeitos 12 armas de fogo calibre.38; uma pistola calibre.40; outra pistola calibre .45; uma espingarda calibre .12; dois coletes balísticos. Além de armas, a PM diz que foram apreendidos 3 kg de maconha; 1,2 kg de cocaína; 300 gramas de crack; além de diversos uniformes camuflados parecidos com as roupas usadas no Exército.
Reprodução: G1 Bahia/ (Foto: Henrique Mendes/G1 BA)