O programa de concessões do governo Michel Temer tem nesta quinta-feira (16) o seu primeiro grande teste com o leilão dos aeroportos de Salvador, Fortaleza, Florianópolis e Porto Alegre. O leilão começa às 10h30 na sede da BM&FBovespa, em São Paulo.
Juntos, os quatro aeroportos devem receber R$ 6,613 bilhões em investimentos. Entre as obras que os concessionários terão que fazer estão reformas e ampliações de terminais de passageiros.
O prazo para a entrega das propostas terminou na segunda-feira (13) e, segundo a agência Reuters, pelos menos três grupos entregaram: a francesa Vinci Airports, a suíça Zurich e a alemã Fraport.
No leilão dos aeroportos de Galeão e Confins, 5 consórcios participaram da disputa. Já no leilão de Guarulhos, Brasília e Campinas, foram 11.
Este leilão tem algumas diferenças em relação aos anteriores. A maior delas é que os grupos vencedores não serão obrigados a ter a Infraero como sócia nas concessões.
Outra diferença é que estes leilões ocorrem em meio à crise econômica e política, que ainda deixa desconfiados os investidores estrangeiros. Apesar disso, o ministro dos Transportes, Maurício Quintella, disse que o governo está confiante no sucesso do leilão.
"Nós apresentamos uma modelagem em resposta a exigências do mercado, retiramos a participação da Infraero, vamos fazer uma concessão pura e o cronograma de desembolso para investimento é aderente ao momento econômico que a gente passa", disse Quintella ao G1.
Apesar da postura otimista, o governo admite que a disputa pelos quatro aeroportos não será tão alta quanto nos leilões anteriores. Isso significa que não vão se repetir os altos ágios e a arrecadação com as propostas dos grupos será mais baixa agora.
Além da economia, a baixa competição também é reflexo da crise enfrentada pelas grandes empreiteiras do país, alvos da Lava Jato. Protagonistas nos leilões anteriores, dessa vez essas empresas estarão ausentes.
Concorrência
O secretário especial da Secretaria do Programa de Parcerias de Investimentos (PPI), Adalberto Vasconcelos, afirmou que espera propostas para os quatro aeroportos, mas que não devem haver grandes ágios (diferença entre o lance mínimo fixado pelo governo e a oferta do grupo vencedor).
“A nossa expectativa é que vai ter concorrência para os quatro aeroportos. O momento é adequado para o Brasil, que começa a dar sinais claros de recuperação econômica”, avaliou Vasconcelos.
O secretário destacou que um dos pontos que deve influenciar o valor do ágio é a redução da demanda por voos no Brasil em 2016, reflexo da crise. Nos quatro aeroportos que vão a leilão, o movimento caiu 11% no ano passado, na comparação com 2015, o que equivale à perda de 3,024 milhões de passageiros.
Vasconcelos, porém, minimizou a importância do ágio para o sucesso do leilão. Ele apontou a dificuldade dos atuais concessionários, que ofereceram ágios altos, para pagar suas outorgas (valor devido ao governo pela concessão).
O governo chegou a permitir que esses concessionários adiassem o depósito das parcelas anuais das outorgas. A situação mais delicada é a da concessionária do aeroporto do Galeão.
“Queremos contratos que fiquem de pé durante todo o tempo de execução”, disse Vasconcelos.
Como será o leilão:
Leva o aeroporto quem ofertar o maior valor sobre o lance mínimo inicial definido pelo governo.
As propostas para todos os aeroportos serão abertas ao mesmo tempo.
Poderá haver lance viva-voz. Para se credenciar para esta fase, um grupo deverá ter oferecido uma das três maiores propostas para cada aeroporto; ou então ter apresentado lance equivalente a pelo menos 90% da maior proposta.
Uma mesma proponente não pode vencer dois aeroportos na mesma região, mas pode arrematar um do Sul e outro do Nordeste.
Se apenas uma empresa apresentar propostas para os dois aeroportos da mesma região, ela será declarada vencedora do aeroporto que apresentou o maior valor de outorga.
Novos grupos
Segundo analistas ouvidos pelo G1, o leilão deve ser marcado não só por menor disputa e ágio, mas também pela entrada de novos grupos no setor. E há quem não descarte eventual encalhe de algum dos aeroportos.
"O ambiente anterior que levou a ágios mais altos era de estabilidade e demanda bombando. Quando o investidor coloca o seu dinheiro num ambiente de crise, demanda reprimida e gestão de risco, a tendência é que ele pague bem menos", afirma o coordenador no núcleo de infraestrutura e logística da Fundação Dom Cabral, Paulo Resende.
Dessa vez, ao invés de consórcios liderados por grandes construtoras, alvos da Lava Jato, os protagonistas deverão ser empresas estrangeiras, que já operam aeroportos em outros países.
Embora o edital permita a participação das atuais concessionárias, esses grupos devem ficar de fora, já que enfrentam dificuldades para honrar o pagamento das outorgas.
Entre os problemas que podem ter afastado os investidores nessa nova rodada de licitação de aeroportos, os analistas citam as dúvidas em relação às projeções de demanda futura dos aeroportos e riscos não gerenciáveis, como custo de desapropriação de terras e desocupação de imóveis.
"Temos hoje seríssimos problemas de disponibilidade de crédito no país e não sabemos como esses grupos internacionais estão analisando a modelagem financeira, toda a parte de demanda, os passivos ambientais e estabilidade política do país", diz o especialista em infraestrutura e professor da FGV-RJ, Marcus Quintella.
Outras regras do leilão:
Atuais concessionários dos aeroportos já concedidos podem participar da disputa.
Os consórcios devem ter uma empresa especialista em administração aeroportuária com participação mínima de 15% e experiência de 5 anos em operação de aeroportos com movimento entre 4 milhões e 9 milhões de passageiros por ano.
A participação de empresa aérea nos consórcios está limitada a 2%.
O ágio, que é a diferença entre o lance mínimo e o valor da proposta, terá que ser pago na assinatura do contrato, junto com 25% do valor do lance mínimo.
Os 75% restantes serão pagos ao longo da concessão, em parcelas anuais.
O edital prevê carência de 5 anos para o pagamento das parcelas. O pagamento começa no sexto ano da concessão e o valor aumenta até o nono ano.
A partir do 10º ano, a parcela anual terá valor fixo, sendo atualizada apenas pela inflação.
Interesse
Fernando Marcondes, sócio da área de infraestrutura do escritório L.O. Baptista, avalia que o aeroporto mais complicado é o de Porto Alegre.
"Porto Alegre é o que mais corre o risco de dar vazio. A conta dele é um pouco mais difícil de fechar, com um volume grande de desapropriação", afirmou.
Apesar das melhoras no edital, com relação aos editais antigos, Marcondes avalia que ainda há um risco muito grande para os concessionários.
Entretanto, o advogado especializado em infraestrutura avalia que, mesmo que um dos quatro aeroportos não seja leiloado, o resultado não deve influenciar os outros leilões do governo.
"Cada rodada tem vida própria, não acredito que vá influenciar os próximos", disse.
Investimentos
As novas concessionárias terão que fazer, de imediato, uma série de ações de melhorias. As adequações devem ser concluídas até o final da fase de transição do controle da Infraero para a nova concessionária. Entre eles, estão:
Melhorias das condições de utilização dos banheiros e fraldários do aeroporto;
Revitalização e atualização das sinalizações de informação dentro e fora do terminal de passageiros;
Disponibilização de internet wi-fi gratuita de alta velocidade em todo o terminal;
Revisão e melhoria do sistema de iluminação das vias de acesso de veículos aos terminais, estacionamentos de veículos, terminais de passageiros e de carga e outros setores que envolvam a movimentação de passageiros e seus acompanhantes no lado terra do aeroporto;
Revisão dos sistemas de climatização, escadas rolantes, esteiras rolantes, elevadores e esteiras para restituição de bagagens;
Correção de fissuras, infiltrações, manchas e desgastes na pintura de paredes, pisos e forros (inclusive área externa) dos terminais de passageiros.
Reprodução: G1