Um documento obtido pelo G1 direcionado ao governador do Rio, Luiz Fernando Pezão, mostra a preocupação da Secretaria de Estado de Administração Penitenciária (Seap) com possíveis rebeliões e motins dentro das unidades prisionais. O motivo? A eventual falta de alimentação dos detentos, por conta dos atrasos nos pagamentos aos fornecedores diante da crise vivida pelo estado.
O documento, assinado pelo titular da pasta, Erir Ribeiro Costa Filho, é de 19 de abril deste ano. Cita "consequências incalculáveis" causadas por uma possível falta da prestação do serviço.
"Cabendo ressaltar, inclusive, que não temos condições de sequer reparar os danos a serem causados pelos detentos".
De acordo com um levantamento feito pelo G1 no Portal de Transparência do governo do RJ, nenhum centavo foi pago dos 16 contratos celebrados para a alimentação dos detentos em 2017. Os valores devidos a estas empresas chegam perto de R$ 100 milhões somente este ano. Apesar do que consta no portal, a Secretaria de Estado de Fazenda informou que de janeiro a abril de 2017 efetuou R$ 56 milhões em pagamentos a fornecedores de comida para presídios.
Mesmo assim, o documento indica que a inadimplência do Estado seria de R$ 180 milhões, incluindo contratos do ano passado, e teria provocado o pedido de rescisão do contrato pelas três empresas que fornecem cerca de 23 mil refeições diárias para mais de 10 unidades prisionais.
"Convém expor que 02 (duas) empresas, no mês de março de 2017, responsáveis pelo fornecimento de 14.000 (quatorze mil) refeições diárias destinadas a 13 (treze) Unidades Prisionais, pediram rescisão dos seus respectivos contratos por não estarem mais suportando tal inadimplência por parte do Estado, e no dia 12 de abril deste ano corrente, mais 01 (uma) empresa, responsável pelo fornecimento de 9.000 (nove mil) refeições diárias, notificou esta SEAP solicitando também a revogação do contrato firmado com esta Secretaria”, destaca o documento dirigido ao governador.
Dois dos acordos firmados já foram substituídos, mas a eventual necessidade de conseguir outra empresa substituta provocou o receio da secretaria.
“Posto essa situação, cumpre informar que esta SEAP já teve uma imensa dificuldade em encontrar 02 (duas) empresas dispostas a assumirem as obrigações das que rescindiram seus contratos anteriormente. Caso a empresa que nos notificou informando que não terá mais condições de fornecer alimentação pare de fornecer, não teremos mais como colocar outra no seu lugar, uma vez que todas as empresas encontram-se endividadas devido à inadimplência do Estado“, relata o secretário.
O secretário pede ao governador Luiz Fernando Pezão que, para evitar consequências piores, o governo estadual libere verbas para o pagamento da alimentação dos detentos.
“Portanto, a fim de evitarmos iminentes desastres, solicitamos que seja disponibilizada ‘mensalmente’ a quantia de R$ 30.000.000,00 (trinta milhões de reais) para que seja destinada ao pagamento das empresas de alimentação”, revela o documento.
"Cabe reconhecer o esforço adotado por Vossa Excelência [governador Pezão], a fim de solucionar as demandas do Rio de Janeiro que, como é sabido, vem atravessando um período de grave crise financeira", diz o texto.
Por fim, o documento destaca que a função da Seap não é apenas evitar rebeliões e prejuízos ao estado, mas também cumprir a legislação que determina que o poder público deve cumprir o direito dos presos a uma alimentação adequada.
"Entretanto, o cumprimento de determinadas obrigações é essencial para a realização de suas funções, mormente no que tange a segurança de toda a sociedade", diz a carta, que se encerra com uma lista das empresas que possuem contratos de fornecimento de alimentação ao sistema prisional e quanto estaria sendo devido a cada uma delas.
Questionada, a Seap informou que não se pronunciaria sobre o conteúdo de documentos confidenciais. O G1 também entrou em contato com as empresas responsáveis pelo fornecimento de alimentos para os presídios do RJ mas não obteve resposta até a publicação desta reportagem. A Milano, uma das fornecedoras, enviou nota afirmando que a empresa está em contato com o Governo do RJ e espera receber os pagamentos devidos.
Reprodução/G1