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Valor de propina da Odebrecht paga a políticos daria para construir 5,4 mil creches

Se o recurso fosse aplicado para a compra de veículos de resgate ou transporte de estudantes, seria possível adquirir 84 mil ambulâncias

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Os mais de R$ 10 bilhões que a Odebrecht usou para pagar propina a políticos poderia ter sido investido em escolas, postos de saúde, compras de ambulância e muito mais. O cálculo apresentado pelo Bom Dia Brasil aponta que, com este valor, daria para construir 5.421 creches para atender mais de 867.360 crianças.

Se o recurso fosse aplicado para a compra de veículos de resgate ou transporte de estudantes, seria possível adquirir 83.944 ambulâncias ou mais de 55.257 ônibus escolares. O valor usado para pagar propina também daria para construir mais de cinco mil UPAs, as unidades de pronto atendimento.

A conta foi feita pela associação Contas Abertas. Segundo o secretário-geral da instituição, Gil Castelo Branco, o cálculo se baseia em valores do Ministério do Planejamento e da Comissão de Orçamento do Congresso.

"É muito dinheiro que poderia estar indo para construir a infraestrututa do estado e está indo para o bolso de alguns corruptos", disse.

O total de propina paga pela Odebrecht consta em uma tabela entregue à Procuradoria Geral da República (PGR) pelo ex-executivo do grupo Hilberto Mascarenhas, responsável pela Área de Operações Estruturada, conhecida como o setor de propina da empresa. O setor movimentou US$ 3,3 bilhões, o equivalente a R$ 10,6 bilhões, de 2006 a 2014.

Hilberto Mascarenhas diz que pagamentos de departamento totalizaram mais de US$ 3 bilhões

Em depoimento aos investigadores da Operação Lava Jato, ele contou que chegou a alertar o presidente do grupo, Marcelo Odebrecht, para o volume do dinheiro, que alcançou, tanto em 2012 quanto em 2013, US$ 730 milhões (R$ 2,2 bilhões, na cotação atual).

No depoimento, o procurador questiona o motivo da queda, no ano seguinte, para US$ 450 milhões e Hilberto diz que a movimentação trazia risco de "suicídio" para a empresa.

"Sabe por quê? Porque eu tava de saco cheio de falar. E aí eu pressionei. Os outros anos eu falava, falava que eu estava preocupado, estava preocupado, muita gente participando desse assunto nas obras … Eu fui a Marcelo várias vezes. Marcelo, ó pra isso? Não tem condição. 730 milhões de dólares é mais de bilhão [de reais]. Nenhum mercado tem isso em disponibilidade de dinheiro por fora e nem tem como você operar isso, rapaz. Isso aqui é suicídio", disse.

"Suicídio financeiro suponho?", emenda o procurador.

"Suicídio financeiro, suicídio de risco, suicídio de segurança, suicídio de tudo", completa o ex-executivo. "Eu pedia um formalismo, entendeu? A questão não era o dinheiro. Era um formalismo. Vamos tratar esse assunto como um extra, como uma necessidade. Isso não é você ter o prazer de comprar alguém. Já estava virando o cara ter o prazer de comprar alguém", narrou.

O setor funcionou até 2015, mesmo após o início da Operação Lava Jato, por ordem de Marcelo Odebrecht.

Forma dos pagamentos

Em outro trecho, o responsável pelo departamento de propina explica que os pagamentos, para brasileiros ou estrangeiros de vários países onde a Odebrecht tinha obras, era quase todo feito via offshores, empresas que são criadas em paraísos fiscais apenas pra essas operações financeiras.

Outra parte, menor, era feita em espécie, com a entrega de pacotes ou malas de dinheiro em locais combinados entre funcionários da empresa e intermediários dos políticos. Com o crescimento do volume de pagamentos, foi preciso contratar um funcionário só para administrar os valores.

Hilberto ainda explicou que, por ordem de Marcelo Odebrecht, as propinas só podiam ser pagas naquelas obras cujos pagamentos já haviam sido efetuados para a empreiteira.

"Ele [funcionário] tinha um papel determinado por Marcelo, que não desse andamento a nenhuma solicitação, de nenhuma obra, que tivesse conta corrente negativa. Acho que o que ele queria era forçar aquela obra a correr atrás de regularizar a conta corrente", afirmou.

O executivo ainda conta que depois tentou convencer o presidente do grupo a autorizar repasses de propina antes do pagamento pela obra, de forma a viabilizá-lo.

"Se você proíbe que ele receba esse dinheiro, ele não vai receber a fatura, ele vai continuar sempre negativo… 'Não, mas eu quero que ele corra atrás', ele dizia, 'sem precisar dar nada'… Isso é um sonho na noite de verão né, porque não era assim que funcionava. Esperamos que no futuro mude, mas as tesourarias dos órgãos não funcionavam assim… Se não me der o meu, não sai aqui o pagamento", contou.

Reprodução/G1