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Decisão do TRF4 dificulta estratégia de defesas contra Lava Jato

Desembargadores do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região aprovaram súmulas que autorizam abrir investigação com base em denúncia anônima e a renovação sucessiva de interceptação telefônica

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TRF4. Foto: Sylvio Sirangelo/EstadãoDesembargadores do Tribunal Regional Federal da 4.ª Região (TRF-4) aprovaram súmulas que autorizam abrir investigação com base em denúncia anônima, “quando amparada por outro indício”, e a renovação sucessiva de interceptação telefônica “caso persista a necessidade de apuração”. Na prática, as decisões dificultam duas das principais contestações à arregimentação de provas em investigações, entre elas a Operação Lava Jato. As súmulas, aprovadas por unanimidade pela 4.ª Seção do tribunal, representam a interpretação majoritária do colegiado e devem ser seguidas pelos demais magistrados vinculados àquela corte. O TRF-4 mantém jurisdição no Paraná, base da Lava Jato. Advogados de investigados na operação criticaram o entendimento dos desembargadores. Segundo o criminalista Antonio Claudio Mariz de Oliveira, as decisões representam “desprezo às garantias individuais” de investigados.

“A renovação sucessiva de interceptações deixa o cidadão que tem a sua comunicação interceptada à mercê de uma decisão amparada apenas em informações subjetivas”, afirma Mariz, defensor de um ex-executivo da Camargo Corrêa investigado na Lava Jato.

O advogado se refere à súmula 129, que afirma ser “lícita a sucessiva renovação da interceptação telefônica, enquanto persistir sua necessidade para a investigação”. A questão é controversa e suscita discussões no meio jurídico.

A lei determina que a escuta “não poderá exceder o prazo de quinze dias, renovável por igual tempo, uma vez comprovada a indispensabilidade do meio de prova”.

Uma resolução do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) e decisões de tribunais Brasil afora, no entanto, admitem o emprego desse instrumento de investigação por mais tempo, desde que essenciais para desvendar os crimes em apuração.

A escuta telefônica considerada a origem da Operação Lava Jato é um exemplo. O alvo da interceptação, que durou mais de 30 dias, era o doleiro Carlos Habib Chater, dono do Posto da Torre, em Brasília. Foi a partir dele que a força-tarefa chegou ao doleiro Alberto Youssef, um dos primeiros delatores.

Caso Sundown. O entendimento jurídico sobre escutas telefônicas também está em debate no Supremo Tribunal Federal (STF), que analisa o cancelamento pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), em 2008, da Operação Sundown.

O caso, que envolvia crimes financeiros, teve dois anos de interceptações telefônicas. O juiz que conduziu o processo foi Sérgio Moro, hoje responsável pela Lava Jato em Curitiba. O STF vai debater se o limite para escutas é de 30 dias ou se cabe, se necessário, esticá-lo.

Para procuradores ouvidos pela reportagem, uma medida contrária à súmula do TRF-4 pode abrir um precedente perigoso não só para a Lava Jato, mas para todas as investigações.

Em 2008, quando o STJ anulou a Operação Sundown, os procuradores Deltan Dallagnol e Orlando Martello, que eram responsáveis pela acusação e hoje atuam na Lava Jato, divulgaram nota em que afirmaram que “a validade da renovação consecutiva do monitoramento sempre foi admitida e é absolutamente necessária para apurar qualquer crime com razoável complexidade probatória”.

Denúncia anônima. Em outra súmula, o tribunal entendeu ser “válida a instauração de procedimento investigatório com base em denúncia anônima, quando amparada por outro indício”.

Trata-se de assunto igualmente polêmico. Em 2011, por exemplo, uma das principais operações de corrupção no Brasil, que envolvia políticos e executivos de empreiteira, foi anulada pelo STJ com o argumento de que juízes não podem permitir a quebra de sigilos de qualquer espécie com base exclusiva em “denúncias anônimas”.

Na época, a Polícia Federal foi autorizada a acessar bancos de dados de empresas telefônicas, o que forneceu provas contundentes ao caso.

O desembargador Fausto Martin de Sanctis, do Tribunal Regional Federal da 3.ª Região (TRF-3), que autorizou a Castelo de Areia na primeira instância, defendeu a medida e disse que “a denúncia anônima é estimulada pelas Convenções da ONU de combate ao crime organizado e à corrupção”.

“Ela é útil desde que complementada com informações relevantes que confirmam seus elementos”, afirma. “A súmula (do TRF4) nada mais expressou do que a importância deste meio limiar de prova como, aliás, já referendou o próprio Supremo em vários casos.”

De Sanctis, que se notabilizou durante a Operação Satiagraha, também anulada em instâncias superiores, também defendeu a súmula que trata das escutas. “A limitação no tempo dessa prova significaria desconsiderar o quão difícil é a apuração do crime organizado que demanda análise segura das informações, em sua maioria apenas confirmadas com o passar do tempo”, diz o desembargador.

Reprodução: Estadão