A presidente do Supremo Tribunal, Cármen Lúcia, rebateu nesta segunda-feira (7) as reclamações sobre a chamada judicialização da saúde. Para ela, que também preside o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), as sentenças que garantem acesso a tratamentos e medicamentos fazem parte do processo de democratização da sociedade brasileira.
“Há uma democratização da sociedade brasileira. O cidadão brasileiro que morria até pelo menos a década de 1980, antes dessa Constituição, não sabia que ele tinha direito à saúde, que podia reivindicar. Hoje ele sabe e vai à luta, porque a democracia voltou ao Brasil. Graças a Deus!”, disse ao participar da abertura das oficinas para juízes sobre saúde. A capacitação, parte do termo de cooperação entre o CNJ e o Ministério da Saúde, ocorre no Hospital Sírio-Libanês, na capital paulista.
Além de promover o encontro, o hospital vai, em conjunto com o CNJ, criar um banco de dados com informações técnicas para subsidiar os magistrados. As informações também poderão ser usadas pelos núcleos de apoio criados para atender juízes e desembargadores que precisarem decidir sobre questões envolvendo o Sistema Único de Saúde (SUS).
Custos
Os gastos elevados com tratamentos determinados pela Justiça são uma preocupação do governo federal e das administrações estaduais. Segundo o Ministério da Saúde, o SUS terá de arcar com R$ 7 bilhões neste ano. “A sentença não cria um dinheiro novo, ela desloca um que já existe”, reclama o ministro da pasta, Ricardo Barros, destacando que as decisões dificultam o planejamento da administração dos recursos.
Para Cármen Lúcia, entretanto, os juízes devem agir independentemente dessas pressões. “Eu sou juíza, não sou ministra da Fazenda. Não desconheço a responsabilidade dele. Eu não sou ministra da Saúde. Eu sou juíza, eu tenho a Constituição, que diz que é garantido o direito à saúde. Eu estudo que a medicina pode oferecer uma alternativa para essa pessoa viver com dignidade. Convenhamos, a dor tem pressa”, acrescentou durante a abertura do encontro.
A parceria de apoio técnico vai, segundo a presidente do STF, minimizar os problemas de compatibilidade entre o atendimento coletivo e as demandas urgentes individuais. “O que nós estamos trabalhando é, com a criação desses núcleos, oferecer condições para imediatamente decidir com a informação precisa de médicos”, ressaltou a presidente.
A falta desse tipo de informação técnica deixa, de acordo com ela, os magistrados sem base para tomar as decisões. “Os juízes, muitas vezes, decidem sem saber exatamente se aquele era o medicamento que era necessário. Se não tinha outro ou outro tratamento. Porque a nossa especialidade não é essa”, acrescentou.
Fraudes
Tanto o ministro da Saúde quanto o secretário estadual de Saúde de São Paulo, David Uip, comentaram ainda sobre as fraudes envolvendo as decisões judiciais.
“Em um daqueles medicamentos [de alto custo], os dez mais demandados, 80% das demandas estão em único escritório de advocacia”, enfatizou o ministro.
Ele evitou, entretanto, dizer que o caso indicava uma fraude. “Isso quer dizer que há uma articulação para a busca ativa dos casos que procuraram ser atendidos. São tratamentos que custam R$ 1,3 milhão por ano, por paciente. Obviamente, existe através das associações de pessoas que demandam à Justiça uma articulação com alguns escritórios que buscam um nicho de atendimento”, disse sobre o caso.
O Ministério da Saúde está, segundo Barros, trabalhando para identificar fraudes nesse tipo de determinação judicial. “Estou verificando todo o processo da formação da decisão judicial. E depois nós vamos na ponta verificar em cada residência, ver se a pessoa está de fato consumindo aquele medicamento adequadamente”, detalhou.
O governo de São Paulo assinou hoje um termo de cooperação com o Ministério Público estadual para apurar irregularidades em decisões judiciais que envolvem tratamentos de alto custo. “Sigilosamente, nos casos que nós entendermos que há corrupção, o Ministério Público vai nos auxiliar”, disse Uip após relatar que já foram identificados, no estado, casos de compra de medicamentos sem necessidade.
Agencia Brasil