Os 128 anos de abolição da escravatura, por meio da Lei Áurea, ainda não foram suficientes para apagar os quase 400 anos de sofrimento do povo negro neste país. Prova disso é que, diariamente, pessoas negras são vítimas de racismo e morrem pelo simples fato de terem nascido ‘pretas’.
No Brasil, estima-se que, 289 pessoas brancas foram mortas por arma de fogo, enquanto isso, quase 4.000 jovens negros foram vítimas de homicídio. Os dados foram coletados através do Mapa da Violência, em 2014 — último dados levantados no país.
Acerca disto, surge um outro grande problema. Boa parte dessas mortes são causadas por aqueles que deveriam fazer a segurança da população, os policiais. Na capital baiana, os negros que andam nos becos e vielas dos bairros periféricos conseguem perceber a falta de liberdade que é imposta para os cidadãos, que ficam a mercê da própria sorte quando são abordado por militares, que, muitas vezes, agem de forma preconceituosa e matam inocentes.
O estudante Alessandro Silva, de 16 anos, é morador do bairro Lagoa da Paixão, que fica no Subúrbio Ferroviário de Salvador. Literalmente, ele já sofreu na pele o preconceito pela Polícia Militar da capital. Conta que já foi alvo dos “hômi” três vezes, mas em uma delas ele percebeu nitidamente o preço que se paga por ser negro e usar determinadas marcas e tipo de penteados.
Segundo Alessandro, um simples passeio com seu cachorro se transformou em um show de horror. Na ocasião, ele teria passado por um grupo de jovens brancos que estavam fumando maconha, mas mesmo não conhecendo os rapazes, ele se tornou o alvo da abordagem que acontecia no local.
“Quando eles me viram passar com meu cachorro, xingaram e mandaram eu parar. Me deram tapas, murros bicudas e bateram nas minhas partes intimas, perguntando cadê a droga”, contou.
Alessandro conta também que após abordagem violenta, ele foi colocado no fundo da viatura sob acusações de estar portanto drogas. “Eles me colocaram na mala e disseram que se me levassem, meus país não iam saber onde me encontrar. Além disso, a todo mundo eu ouvia que ia morrer”, disse Alessandro bastante emocionado.
Ainda segundo o adolescente, por ‘sorte’ um policial aposentado, que é vizinho dele, passou na hora do ocorrido e interviu na ação. A partir desse episodio, conta, não confia mais no trabalho da polícia.
AUSÊNCIA DE ESTATÍSTICAS
Diferente de outros estados dos país como Rio de Janeiro e São Paulo, a Bahia não tem um levantamento sobre mortes de negros e pardos em ações policiais. Com 82% da população considerada negra em Salvador, não existe uma preocupação por parte do poder público em definir dados que revelem quanto deste número são mortos por militares.
De acordo com dados da Secretaria de Segurança Pública (SSP), boa parte dos casos acontecem em ações de resistências nas abordagens, por isso, não é possível determinar os dados.
O jornalista Eduardo Machado, de 32 anos, é educador social do projeto ‘Juventude Negra e Participação Política’, que atende crianças e adolescentes do Lobato. Ele conta que o tratamento dos militares é diferenciado em determinados bairros da cidade. “Na barra, eles dão boa tarde, pedem seus documentos. Mas aqui no Lobato não tem bom dia e nem boa tarde, na verdade aqui não tem se quer ser humano para eles, e eu vejo isso como práticas da época de escravidão, com a diferença que hoje o capataz veste farda”, disse ele em tom de revolta.
Ele conta, ainda, que também foi vítima de várias ações truculentas e equivocadas da Polícia Militar da Bahia. Na situação mais perversa, ele estava voltando da praia com a namorada e outro casal de amigos, e tentou pegar um táxi, mas teve o pedido negado pelo racismo de cada dia e por fim acabou saindo na mala de uma viatura.
Sendo referência em ações que garantem a ampliação de direitos das mulheres, jovens e da população negra em geral, a socióloga e ouvidora da Defensoria Pública da Bahia, Vilma Reis, 46 anos, afirma que é preciso ir atrás dos seus direitos, caso passe por situações de abuso de poder por parte da polícia.
Ela aconselha também que além de um boletim de ocorrência, a vítima procure a Defensoria Pública, antes mesmo de ir as corregedorias das policias civil e militar. Veja vídeo:
Com objetivo dar mais visibilidade aos casos de violência contra negros, em Salvador, a reportagem do Aratu Online entrou em contato com o movimento Reaja ou Será Morta Reaja ou Será Morto. Porém eles não quiseram falar com nossa equipe, nem emitir nota sobre o tema.
Reprodução: Aratu On line