O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, opinou que a proibição de alimentos e bebidas de outros estabelecimentos comerciais em salas de cinema é inconstitucional por afrontar a livre concorrência e a defesa do consumidor. Ainda segundo Janot, a proibição acaba caracterizando venda casada de produtos. A manifestação foi enviada ao Supremo Tribunal Federal, em parecer à Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 398.
A ação é de autoria da Associação Brasileira das Empresas Exibidoras Cinematográficas Operadoras de Multiplex (Abraplex) e questiona decisões consolidadas do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que consideraram ilegal cinemas impedirem a entrada dos consumidores portando bebidas e alimentos comercializados por terceiros, ou seja, os que não foram vendidos pelas bombonerias e lanchonetes do próprio cinema.
Preliminarmente, Janot argumenta que a Abraplex não tem legitimidade para propor esse tipo de ação. Ele também aponta que a ADPF não pode ser utilizada contra orientação jurisprudencial, alertando que o instrumento deve ser contra ato do poder público que lese, mesmo que potencialmente, núcleo de regras essenciais à manutenção da ordem constitucional. No caso em questão, segundo o parecer, o que é afetado é o interesse das empresas representadas pela Abraplex. Diante disso, o parecer é pelo não conhecimento da ADPF.
No mérito, se for conhecida a ação, Janot sustenta que agentes econômicos muitas vezes promovem iniciativas para garantir espaço no mercado e possibilitar maior participação nele, o que é uma decorrência do livre mercado. No entanto, o procurador-geral alerta que algumas dessas condutas são prejudiciais à concorrência e aos consumidores, caracterizado-se como “prática abusiva”.
“Exigência de exclusividade na compra de bens alimentícios acessórios, nessas situações, ultrapassa o amplo espaço de liberdade da iniciativa privada, no que toca à prerrogativa de organizar o próprio negócio, porquanto impõe, de forma abusiva e injustificada, imobilidade e falta de opção ao consumidor, e catividade ao proprietário do cinema, na contramão da Constituição econômica”, afirma Janot, complementando que a prática prejudica consumidores e suprime a concorrência, excluindo agentes econômicos do mercado.
Com a vedação, as opções de escolha dos consumidores são reduzidas, impondo um preço superior para a compra de produtos nas bombonerias e lanchonetes dos cinemas. Outro argumento que Janot usa é o fato de alguns consumidores precisarem ingerir alimentos específicos, em horários predeterminados, em função de dieta ou recomendações médicas. Além disso, há uma prática abusiva de venda casada por via oblíqua. “É inaceitável pretender impedir a liberdade de escolha do consumidor, em nome apenas do desejo de lucro das empresas de exibição”, conclui o PGR.
A Abraplex argumentou que existe lesão à isonomia por tratamento diferenciado em algumas situações que proibiram a entrada de pessoas com alimentos e bebidas de terceiros, como foi o caso da Copa do Mundo de 2014. O procurador-geral lembra que a Lei Geral da Copa, que instituiu essa vedação, era uma norma excepcional e transitória, uma obrigação que o Brasil assumiu perante a Fifa.
Fonte: Secretaria de Comunicação Social – Procuradoria-Geral da República