Depois do ministro Celso de Mello, o mais antigo do Supremo Tribunal Federal (STF), foi a vez do presidente da corte, Ricardo Lewandowski, tomar uma decisão em sentido contrário à maioria de seus colegas. Ele mandou soltar um prefeito do interior da Paraíba preso após ser condenado pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região (TRF5). Em fevereiro, no julgamento de outro caso, o STF entendeu que seria possível prender após condenações em segunda instância, que é o caso do TRF5.
Lewandowski destacou que a decisão tomada em fevereiro não cria efeito vinculante, ou seja, não obriga o Judiciário a tomar a mesma decisão em outros casos. Assim, ele atendeu o pedido da defesa de José Vieira da Silva, prefeito de Marizópolis (PB), que apresentou um habeas corpus para tirá-lo da prisão. O presidente do STF citou inclusive a decisão do ministro Celso de Mello, mandando soltar em 1º de julho um empresário condenado em segunda instância.
"Na espécie, é possível verificar, ao menos em um juízo provisório, que a fundamentação utilizada para decretar-se a prisão do paciente mostrou-se frágil, inidônea, porquanto apenas fez referência a julgamento do Plenário desta Suprema Corte, que, embora, repito, tenha sinalizado possível mudança de entendimento jurisprudencial, não possui qualquer eficácia vinculante", escreveu Lewandowski.
Segundo ele, "a jurisprudência consolidada do Supremo Tribunal Federal é firme no sentido de que ofende o princípio da presunção de inocência a execução da pena privativa de liberdade antes do trânsito em julgado da sentença condenatória, ressalvada a hipótese de prisão cautelar". Destacou ainda que esse sempre foi seu entendimento.
Em fevereiro deste ano, sete ministros entenderam que a pena poderia começar a ser cumprida após condenação em segunda instância. Outros quatro ficaram do lado vencido: Celso, Lewandowski, Marco Aurélio Mello e Rosa Weber. Antes disso, o STF entendia que a execução da pena só poderia ocorrer após trânsito em julgado, ou seja, quando não haveria mais possibilidade de recorrer.
Desde então, o Ministério Público passou a pedir a prisão de condenados em segunda instância. Isso ocorreu no caso de José Vieira da Silva. Em 29 de julho, o TRF5, com sede no Recife e abrangência sobre os estados de Sergipe, Alagoas, Pernambuco, Paraíba, Rio Grande do Norte e Ceará, aceitou o pedido, decretou a perda do cargo de prefeito e determinou o início do cumprimento da pena. A defesa então entrou com um habeas corpus no Superior Tribunal de Justiça (STJ), mas a relatora, ministra Laurita Vaz, negou. Agora, conseguiu uma vitória no STF.
José Vieira da Silva foi acusado de fraude em licitações e desvio de dinheiro em outra cidade, São João do Rio do Peixe, também na Paraíba. Os recursos foram repassados pelo governo federal na década de 1990 por meio do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE) e da Fundação Nacional de Saúde (Funasa). O julgamento no TRF5 ocorreu em 2012, mas ele os outros condenados puderam recorrer em liberdade.
Em relação a esse caso, há um diferencial. Ele não chegou a ser julgado pela primeira instância e foi direto para análise da segunda instância, no caso o TRF5, uma vez que tinha foro privilegiado por ser prefeito. Isso não passou despercebido por Lewandowski. O presidente do STF destacou que "o direito ao reexame das decisões judiciais configura uma garantia constitucional".
O relator do habeas corpus é o ministro Edson Fachin, que, em fevereiro, entendeu ser possível prisão após julgamento em segunda instância. Mas como o STF está de recesso e voltará a funcionar normalmente somente na próxima semana, coube ao presidente do tribunal tomar a decisão. Lewandowski entendeu que o prefeito se encontra em "flagrante constrangimento ilegal" e ressaltou que ficou solto por 16 anos, desde 2000, quando foi feita a denúncia contra ele.
Agencia O Globo