O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva participou nesta segunda-feira, ao lado do compositor Chico Buarque e outros artistas e intelectuais, no Rio, de um ato contra o impeachment da presidente Dilma Rousseff. Cerca de 5 mil pessoas, de acordo com os organizadores do evento, acompanham o ato na Fundição Progresso, na Lapa.
— É uma coisa absurda deixar na mão deste Congresso o futuro do país. Independentemente do resultado da votação, dá nojo e asco ver esse Congresso decidindo algo — afirmou o humorista Gregorio Duvivier, em seu rápido pronunciamento no ato. — O impeachment capitaneado por Eduardo Cunha é como um pênalti marcado pelo Eurico Miranda a favor do Vasco — completou.
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O humorista ressaltou que a manifestação tem críticas ao governo e pediu à presidente Dilma que "melhore e governe para a esquerda, em nome do projeto para o qual foi eleita". Ao todo, cerca de 300 artistas e intelectuais assinaram o manifesto contra o processo de impeachment da presidente — entre eles, Wagner Moura e Caetano Veloso, que não estavam presentes devido a compromissos no Exterior.
Também participaram a sambista Beth Carvalho, a atriz Letícia Sabatella, o teólogo Leonardo Boff, o escritor Eric Nepomuceno e os dramaturgos Aderbal Freire Filho e José Celso Martinez Correa, entre outros artistas, juristas e intelectuais. No campo político, acompanharam o ato o ex-presidente do PSB Roberto Amaral e o ex-ministro de Relações Exteriores Celso Amorim.
Em seu discurso, Leonardo Boff disse que o evento celebrava um "sepultamento":
— É o sepultamento do impeachment. A democracia tem a natureza da flor. Ela é frágil, (…) mas tem a força de sua beleza. (…) Essa democracia está sendo ameaçada agora, especialmente por aqueles que estão atualizando a casa-grande, esses que sempre dominaram o nosso país. Eles também falam de democracia, mas é uma democracia reduzida. Eles falam de um Estado democrático. Não de direito, mas de privilégio — discursou o teólogo.
O compositor Chico Buarque afirmou que não iria se pronunciar, mas que mudou os planos. O discurso, no entanto, foi rápido:
— Não vai ter golpe! — disse o artista carioca.
Beth Carvalho puxou um samba, segundo ela, feito na noite anterior à do evento. O refrão "Não vai ter golpe de novo/ Reage, reage, meu povo" foi acompanhado pelo público presente na Fundição Progresso.
Integrantes de diversos movimentos sociais também estão presentes, como UNE, MST, CUT, Unegro, Federação Única dos Petroleiros (FUP), além de militantes de PT, PCdoB, PSOL e PDT. Do lado de fora, nos Arcos da Lapa, uma multidão acompanha pelo telão os discursos dos artistas, enquanto aguarda pronunciamento do ex-presidente Lula.
O manifesto, lido pelo escritor Eric Nepomuceno, chama de "ressentidos da derrota e aventureiros do desastre" os apoiadores do impeachment no Congresso.
— Entendemos claramente que o recurso que permite a instauração do impedimento presidencial integra a Constituição Cidadã de 1988. E é por respeito a essa Constituição que seu uso indevido e irresponsável se constitui um golpe institucional. Quando não há base alguma para sua aplicação, o que existe é um golpe de Estado — diz o texto.
No palco, os artistas fizeram menção às pesquisas de intenção de voto, divulgadas pelo instituto Datafolha, no domingo, e também à falta de "fundamento jurídico e crime de responsabilidade" no pedido de impeachment que tramita no Congresso. Citado pelo dramaturgo Aderbal Freire Filho, o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso foi vaiado pelo público.
Já o ex-presidente Lula afirmou que não quer incitar a luta de classes no país ou dividir a sociedade. Em seu discurso, afirmou que defender o governo é defender a "honra das mulheres brasileiras" e criticou os ataques à presidente.
— Acham que quero incitar a luta de classes. Não quero dividir a sociedade. O país não pode ser dividido entre aqueles que se acham mais brasileiros porque usam verde e amarelo. Não se mede o brasileiro pela cor da camisa, mas pela vergonha na cara e pelo trabalho que fazemos — afirmou o ex-presidente. — Vejo que eles têm ódio de mim, vejo como eles me tratam. Mas nesse país ninguém governou o país para todos mais do que eu — completou.
O ex-presidente comparou os movimentos contra a presidente ao fascismo e ao nazismo.
— Eles não gostam de política, negam a política. Em São Paulo, não deixaram o Alckmin e o Aécio falarem. Quem fala por eles é o Bolsonaro. Foi assim que nasceu o nazismo e o fascismo. Aqui, aprendemos a gostar de democracia, pois somente a democracia permite que um cara como eu chegue a presidência.
Lula ainda afirmou que solicitaram a ele que usasse coletes a prova de balas em manifestações na Avenida Paulista.
— No dia em que eu estiver medo, eu prefiro não sair de casa. Se quiserem me derrotar, vão ter que aprender que nós não saímos nas ruas apenas aos domingos, mas de segunda a sexta, o ano inteiro — completou.
Ele também classificou de "injusta" a campanha contra a presidente Dilma Rousseff.
— Eu aguento muita bordoada, mas não é justo eles fazem com a Dilma. A gente não está defendendo apenas o direito de uma mulher ser presidente, estamos defendendo a honra das mulheres brasileiras que sempre foram tratadas como objeto.
Lula afirmou, por fim, que a "elite brasileira nunca se preocupou que o pobre estudasse". Segundo ele, os governos do PT mudaram esta "lógica".
— Para eles, o pobre nasceu pra ser faxineiro, eles que nasceram pra ser engenheiros. Falo com orgulho, só tenho diploma primário e o curso do Senai. Mas vou passar para a história como o presidente que mais fez universidades nesse país. Isso incomoda. Como pode esse peão analfabeto ter mais título de doutor honoris causa que o sociólogo? — alfinetou Lula, sem citar nominalmente o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
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