Durante a gestão de Bolsonaro, famílias pobres do semiárido mineiro que sofrem com a falta de água pagaram pela instalação de cisternas que constavam no programa do Governo Federal.
O contrato de R$ 15 milhões previa instalar 3.012 cisternas nas comunidades isoladas do estado. O contrato foi celebrado entre o Consórcio Inframinas, que reúne prefeituras da região, e do então Ministério da Cidadania.
A partir do convênio, uma entidade privada sem fins lucrativos com sede em Alagoas, a Ceapa (Central das Associações de Agricultura Familiar), foi contratada para executar as obras.
Como as famílias beneficiadas vivem em condição de vulnerabilidade, não havia nenhuma contrapartida para que as cisternas fossem cedidas e devidamente instaladas.
Segundo informações da Folha de S. Paulo, algumas pessoas chegaram a desistir de colocar as cisternas por não ter dinheiro para arcar com a construção dos equipamentos que conseguem armazenar uma grande quantidade de água e ser útil, sobretudo, nos períodos mais secos.
Entre os moradores que tiveram que assumir os custos está o casal Eva Pereira Silva, 54, e Antônio Aguimar da Silva, 60, de Vertente, uma das comunidades isoladas de Coração de Jesus (a 450 km de Belo Horizonte), município contemplado pelo convênio.
Eles deixaram de investir R$ 870 que emprestaram do banco na plantação de capim e preparação do solo, tendo em vista a criação de animais, para acessar o Programa de Cisternas.
O dinheiro acabou sendo usado na compra de cinco metros de areia lavada e na contratação de um ajudante de pedreiro que pudesse abrir um buraco no solo —cujo espaço servirá para acomodar a cisterna de 16 mil litros.
Essa era uma condição da entidade para entrar no programa. E quem não pudesse fazer o serviço sozinho, deveria contratar um servente.
Para economizar, o casal fez como muitos e cavou com as próprias mãos e usando uma enxada. Até o momento, foram entregues 590 cisternas de placas de 16 mil litros, o que representa 19,6% da meta total de 3.012 cisternas previstas no plano de trabalho.
Muitas famílias informaram que receberam de volta R$ 700 de ressarcimento, valor que não cobre todas as despesas e já inclui a alimentação do ajudante. A Ceapa enviou notas fiscais com os pagamentos.
A instituição contratada para construir as cisternas em Minas alega que o valor repassado pelo governo federal era baixo e precisou recorrer às prefeituras das localidades beneficiadas para executar as obras.
"Foi acordado que os municípios ajudariam a custear as despesas mencionadas, tendo em vista o aumento gigantesco dos materiais. Como os municípios não ajudaram, a entidade identificou o erro e o corrigiu a tempo, repassando o que era devido a cada família, sanando assim a inconsistência", disse a entidade à reportagem.
O ex-ministro da gestão Bolsonaro Ronaldo Vieira Bento disse que o ministério fez uma avaliação dos contratos envolvendo o Programa de Cisternas e que o relatório apontou irregularidades apenas em contratos firmados em governos anteriores.
"A gente vinha fazendo um acompanhamento constante justamente pelos problemas que vieram lá de trás", relatou. Bento afirmou na última semana que não tinha detalhes referentes ao convênio firmado em Minas Gerais.
O Consórcio Inframinas afirmou que nenhuma cobrança deveria ter sido feita às famílias e que tomou conhecimento das "supostas irregularidades" durante visita técnica de membros do ministério em outubro passado.