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Amor não tem idade: casal de idosos conta como manter um relacionamento de mais de 40 anos

Pessoas na terceira idade estão cada vez mais abertas para experimentar novidades e embarcar em um novo relacionamento

Luiza Nascimento
Luiza Nascimento

Namorar é bom em qualquer fase da vida e não poderia ser diferente com os casais da terceira idade, afinal de contas, estar apaixonado não é  um privilégio apenas dos jovens. De acordo com dados do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), 37,7 milhões de brasileiros têm 60 anos ou mais. Entre eles, além de muita experiência, é possível encontrar lindas histórias de amor, algumas com muito tempo de duração e outras que estão apenas começando. Pessoas na terceira idade estão cada vez mais abertas para experimentar novidades e embarcar em um novo relacionamento.
 
Seja qual for o caso, além dos benefícios de uma vida a dois, o romance auxilia diretamente na saúde. “O namoro entre os idosos oferece muitos benefícios, alguns deles são: maior dedicação com auto-imagem, melhora a autoconfiança, incentivo na vaidade e ajuda a sentir emoções positivas como alegria e amor, dessa maneira, colaborando para o envelhecimento mais saudável”, é o que explica a psicóloga Danielly Damasceno, sócia da clínica VitalPsi, ao lado de Ana Thereza Martins e Priscila Freitas. 

No caso de Seu Claudemiro, 61 anos, e Dona Zezé, 65, esses benefícios são desfrutados há mais de 40 anos. Casados, eles vivem em um eterno namoro e lembram com detalhes, cada ponto desta história. Eles se conheceram em 1980, através de uma amiga em comum e a beleza de Zezé, o encantou à primeira vista. “Eu me descabelava todo com essa morena. Quando aquele monumento passava aqui… meu Deus do céu! E a colega dela dizia ‘ela não é pro seu bico não’”, relembrou o aposentado que não deixou se abalar após o conselho.
 
Em uma conversa, Zezé deixou escapar a sua paixão pelo carnaval de Salvador e ele, que não gostava da festa, resolveu ir atrás e tentar um primeiro encontro, em uma época onde as formas de comunicação eram extremamente restritas. “Eu só ficava ali no Relógio de São Pedro, que antes tinha trios fixos, porque era tranquilo e eu disse para ele. Ele gravou isso e se ‘emperiquitou’ todo pensando ‘hoje eu vou pegar ela’, e foi pro carnaval, nunca tinha ido. Só que nesse dia me encheram o saco para ir atrás do trio elétrico de Bell Marques. Foi quando ele chegou e não me encontrou. Sabe porque aconteceu isso aí? Porque era o último carnaval  que eu ia brincar. Casamos em fevereiro do ano seguite”, lembrou Zezé.
 
Um mês depois do episódio, finalmente eles se encontraram para tomar sorvete de coco com pistache, o preferido dela, que ele mesmo escolheu e acertou em cheio. “O sabor do beijo ficou gostoso e quando acabou, eu estava doido para tirar uma casquinha”, brincou seu Claudemiro.

Mas nem tudo foi tão doce. Durante a trajetória eles enfrentaram algumas barreiras como fofocas, a perda de um filho e até o afastamento da família por causa do preconceito. “Eu amava minha avó, minhas tias, meus tios, amava de verdade, mas eles tinham uma convicção de nível, falavam que eu tinha que me dar só com quem era de meu nível e eu nunca pensei assim”, explicou Zezé, emocionada.
 
Religiosos e resilientes, do início até hoje, eles se apegam na fé em Deus e no respeito um com o outro para driblar as dificuldades enfrentadas. “Nós dois somos os pilares, temos que andar em equilíbrio, que é o que faz com que um sustente o outro. E esse equilíbrio tem nome: Deus e o nosso amor” disse Claudemiro. “A perfeição dos casais não existe. Alguém tem que ceder. Se você casou, está tudo bem, quando junta os talheres são dois mundos. Ninguém pensa como o outro vai estar daqui a 20 anos, só pensa no agora. Se vê que errou, volte atrás e peça desculpas. Se não tiver coragem hoje, respire, busque força e quando não tiver mais embriagado de raiva, peça perdão. Não é humilhação”, completou.
 
Além de problemas enfrentados na vida a dois, eles tiveram ainda que ouvir comentários ruins vindos de pessoas próximas. “Eu ouvi dizer que um dia um olha pra cara do outro e enjoa. Pela questão de eu ter mais anos do que ele, falaram que não ia dar certo, mas muitos não viveram para ver a duração que tá. E sobre as brigas, ninguém é perfeito, então não dá pra ficar atirando pedra no outro. É por isso que têm muitos casais aí fora que estão se separando como água”, afirmou Zezé.

Pandemia

Separações essas que se tornaram muito evidentes durante os meses mais restritos da pandemia de Covid-19. Um levantamento do Colégio Notarial do Brasil aponta que 77.112 divórcios consensuais foram registrados apenas em 2021. Além das vítimas fatais, o vírus desencadeou inúmeros problemas físicos e psicológicos. Entre os idosos, a situação foi ainda pior, já que eles representam um grupo de risco e tiveram que ter o cuidado redobrado nessa fase.Para Zezé e Claudemiro, que enfrentaram o período juntos, o cenário não foi dos piores. “Foi a época que a gente mais beijou”, lembrou Claudemiro, aos risos.

Durante o período, eles continuaram tendo uma vida ativa, cuidando do filho mais novo, dos pássaros, da casa e ainda com atividades próprias. Seu Claudemiro, por exemplo, tem um prazer enorme em cuidar de suas plantas. Dona Zezé ama compor, cantar e dançar. Ambos quebram o mito de que, na terceira idade, as pessoas perdem o interesse em cuidar de si próprio e das suas atividades particulares. “Não estar em um relacionamento não é o único fator para os idosos não praticarem o autocuidado. Porém não podemos ignorar o fato de que estar em um relacionamento amoroso, especialmente se for uma relação saudável, contribui significativamente para engajar-se com a prática do autocuidado”, ressaltaram as psicólogas. 

Na vida a dois, Zezé e Claudemiro também praticam o cuidado e pregam que as comemorações pela relação devem ser diárias, não apenas em datas especiais como Dia dos Namorados, aniversário de namoro ou casamento. “A surpresa e o agrado podem ser qualquer dia. Você hoje tem como fazer um agrado? Faça! Não espere! Tem uma palavra de amor, uma palavra de carinho, um abraço mais apertado, dê!”, aconselhou Zezé.
 
Por isso, durante a conversa, eles não dosaram os elogios e não deixaram de lado o bom humor presente na relação. “Ele é uma mala, mas é uma mala com alça e com rodinha, que puxa e desliza. Ele é muito parceiro, muito companheiro”, afirmou Zezé e, em meio às brincadeiras, Claudemiro retribuiu. “Ela é gente boa, viu? Se eu falar, vou passar o dia todo aqui. Quando quer me elogiar, só falta me colocar no altar da igreja. É uma companheira excelente, se não fosse isso não estaria nessa batalha comigo até hoje, caminhando lado a lado, nas horas difíceis”, disse.

Mas nem todos conseguem viver um relacionamento assim. Com o tabu que paira sobre o romance na terceira idade, alguns idosos não se permitem embarcar em uma paixão. Alguns têm medo do julgamento, outros acreditam que o amor tem idade. Há os que já não se sentem mais tão atraentes e também quem prefira viver o luto da perda de um parceiro. “O autocuidado é um grande passo para vencer esses obstáculos. Cuidar da alimentação, da saúde, da autoimagem, praticar atividade física, participar de grupos de amigos e aprender algo novo são bons exemplos de atividades terapêuticas e de autocuidado. A partir destes passos simples, a autoconfiança vai aos poucos sendo construída, e consequentemente, auxiliando a vencer os obstáculos”, aconselhou a psicóloga.

Sexo na terceira idade 

Outro mito que está presente nestes relacionamentos é sobre a vida sexual. A sociedade tende a enxergar essas pessoas como avós e automaticamente, atrelar a imagem ao zelo e santidade, acreditando inclusive, que o desejo já não esteja presente. “Infelizmente muitos julgam que os idosos sejam incapazes de sentir desejo ou exercerem sua sexualidade, ainda que, independentemente disso, o desejo sexual se mantenha presente em todas as fases da vida. Entretanto, a relação sexual não é um privilégio apenas dos jovens, os idosos também sentem desejos e apreciam as relações sexuais. Podendo assim a sexualidade ser vivida até o fim da vida”, explica a especialista.

O sexo na terceira idade não só existe como traz inúmeros benefícios. “A relação sexual na terceira idade oferece muitos benefícios, alguns deles são: aumenta a autoestima, ajuda a autoconfiança, favorece as emoções positivas, contribui para a saúde física e emocional”, enfatizou Danielly.