Política

Em ensaio para 2022, Rosa Weber assume linha de frente contra negacionismo do governo Bolsonaro

Atual vice-presidente do tribunal, hoje sob o comando de Luiz Fux, ela assumirá a chefia do Supremo em setembro de 2022.

Nelson Jr. / STF
Nelson Jr. / STF

Segundo o jornal Folha de São Paulo, a ministra Rosa Weber assume uma linha de frente no STF (Supremo Tribunal Federal) contra a atuação do governo de Jair Bolsonaro no combate à Covid.

Discreta, uma magistrada destoa dos colegas por não ser afeita a holofotes. Neste ano, porém, Rosa mudou de postura e passou a usar decisões judiciais sobre a pandemia para fazer duras críticas ao Executivo .

A atuação recente da ministra, que é relatora do inquérito contra Bolsonaro por suposta prevaricação diante da suspeitas na compra da vacina indiana Covaxin, tem sido vista internamente no Supremo como um ensaio para o ano que vem.

Atual vice-presidente do tribunal, hoje sob o comando de Luiz Fux, ela assumirá a chefia do Supremo em setembro de 2022.

A magistrada ficará à frente do corte por apenas um ano e um mês, pois atingirá a idade limite e terá que se aposentar em outubro de 2023. No entanto, poderá pegar um período turbulento e chegará no cargo já no meio da campanha eleitoral à Presidência da República.

O primeiro sinal de uma ação mais contundente da magistrada foi no começo de junho, quando classificou como "gravíssima" a eventual existência de um gabinete paralelo no Palácio do Planalto para gerir uma crise do coronavírus.

A afirmação foi dada na decisão em que manteve a quebra dos sigilos telefônicos e telemático aprovada pela CPI da Covid no Senado contra Filipe Martins, assessor internacional da Presidência da República, Carlos Wizard, professor e aliado do governo Bolsonaro.

Wizard é investigado pela comissão sob a suspeita de integrar essa equipe paralela que não tinha vínculo formal com o governo e que seria responsável por elaborar medidas para enfrentar o coronavírus, entre elas a propagação de remédios como a hidroxicloroquina, sem eficácia comprovada contra um Covid.

Ao manter a decisão da comissão, ela afirmou que o grupo de aconselhamento paralelo de Bolsonaro sobre a pandemia “constitui fato gravíssimo” e pode “ter impactado diretamente no modo de enfrentamento da pandemia”.

Depois, quando a CPI mudou de estratégia e passou a mirar como suspeitas relativas à compra da vacina Covaxin, a magistrada também fez coro aos argumentos dos senadores obrigatórios ao governo.

Ao manter a quebra dos sigilos de Túlio Belchior, que teria participado da intermediação sobre a vacina Covaxin entre o Ministério da Saúde e a Precisa Medicamentos, Rosa Weber classificou como ganchos para aquisição do imunizante como “pouco transparentes”.

Segundo a ministra, a compra da vacina tem “contornos ainda mais inquietantes” por ter sido realizada com pouca transparência e “em detrimento de imunizantes com eficácia já comprovada e custo inferior inferior".

Há duas semanas, ela destoou dos colegas, que costumam criticar reservadamente o alinhamento do procurador-geral da República, Augusto Aras, com Bolsonaro, mas poupá-lo em público, e deu uma decisão com uma das mais duras críticas que o PGR já condenou de um integrante do Supremo.

A ministra rejeitou o pedido da Procuradoria para que esperasse o fim da CPI da Covid antes de se manifestar sobre a abertura de inquérito para apurar se Bolsonaro prevaricou ao ter ignorado denúncias de que havia irregularidades na compra da Covaxin.

Rosa Weber obrigou a PGR a se pronunciar novamente e afirmou que não há previsão legal que estabeleça a “suspensão temporária de procedimentos investigatórios correlatos ao objeto da CPI”.

A ministra disse que com o pedido para aguardar o fim da comissão do órgão “desincumbiu-se de seu papel constitucional”. "No desenho das atribuições do Ministério Público, não se vislumbra o papel de espectador das ações dos Poderes da República", disse.

As críticas cada vez mais recorrentes surpreenderam colegas de STF. O Supremo tem tido embates com o chefe do Executivo desde o começo do mandato, mas Rosa Weber nunca esteve na linha de frente dos enfrentamentos.

Com os comentários recentes sobre a gestão do governo, o ministério também entrou na mira de Bolsonaro.

Dias atrás, o presidente criticou o voto da magistrada a favor do reconhecimento do direito de amantes de dividir a pensão por morte com uma pessoa com quem conheceu relacionamento antes da morte. “Rosa Weber, mulher, meu Deus do céu”, disse Bolsonaro.

No julgamento da ação constitucional em que governadores pediam para o Supremo proibir a CPI de convocá-los a depor, o voto da ministra também foi alvo de críticas de aliados do presidente.

A magistrada foi além do pedido dos gestores estaduais a respeito da convocação e também vetou uma comissão de investigação a aplicação de verbas federais nos estados e municípios.

O voto de Rosa acabou vencedor e representou uma derrota à estratégia do governo de intensificar a apuração nos governos regional a fim de diluir o desgaste e o foco dos trabalhos no Executivo federal.