Será cremado às 15h desta terça-feira, 18, no cemitério Jardim da Saudade o corpo do médico e cientista baiano Elsimar Metzker Coutinho que faleceu nesta segunda-feira, 17, vítima da Covid-19. O médico começou a apresentar sintomas da doença no dia 20 de julho, quando deu entrada no Hospital Aliança (HA) para tratar de uma Síndrome Respiratória Aguda Grave, a partir do dia 29, o médico passou foi internado no Hospital Sírio Libanês, em São Paulo. O ginecologista deixa esposa, cinco filhos, 12 netos e quatro bisnetos, além de um legado marcado pela dedicação à saúde reprodutiva humana.
Desde o dia 20 de julho, Elsimar Coutinho esteve sedado na Unidade de Tratamento Intensivo (UTI). Com o quadro clínico inspirando cuidados, o médico teve de ser submetido à assistência ventilatória mecânica como estratégia de proteção dos pulmões. Posteriormente, o cientista passou a apresentar disfunções renal e pulmonar. Sem sinal de melhoras, a equipe médica do HA iniciou a terapia de substituição renal com hemodiálise. No dia 29 de julho, após apresentar melhora e estabilização no quadro clínico o médico foi transferido para o Hospital Sírio Libanês.
Baiano que ficou conhecido internacionalmente pelas pesquisas que desenvolveu na área da reprodução humana, em especial, na saúde da mulher, em Salvador estava sendo acompanhado pelos médicos Sulivan Hubner, coordenador médico da UTI e pelo diretor da instituição, Raymundo Paraná. O diretor do Hospital Espanhol para a Covid-19, Roberto Badaró, estava atuando como médico assistente do corpo clínico externo à instituição.
Trajetória
Nascido em 18 de maio de 1930 no município de Pojuca, na região metropolitana de Salvador, o cientista Elsimar Coutinho dedicou décadas de estudos à qualidade de vida dos seus pacientes. Cinco anos antes de graduar-se em medicina, Elsimar Coutinho formou-se em farmácia e bioquímica em 1951 na Universidade Federal da Bahia (Ufba), onde posteriormente se especializou e se tornou Doutor em farmácia e bioquímica nos anos 60. Três anos mais tarde, conquistou o título de Doutor em medicina também na federal baiana.
Tempos depois, retornou à Ufba onde ocupou o cargo de professor titular no departamento de ginecologia, obstetrícia e reprodução humana. Fora do país, a ânsia pela ciência o levou à especializações na área da endocrinologia na Universidade de Sorbonne, em Paris. Já nos Estados Unidos, estudou no Instituto Rockfeller, na cidade de Nova York.
Dono de posicionamentos polêmicos e muitas vezes à frente do seu tempo, na década de 60, o cientista desenvolveu o Depo Provera, primeiro anticoncepcional injetável de uso prolongado. Também naquela época desenvolveu outras estratégias contraceptivas utilizadas até os dias de hoje, como as pílulas para uso oral e vaginal e os implantes hormonais subcutâneos com efeito prolongado. O cientista foi responsável pelo primeiro caso de regressão de mioma seguido de gravidez relatado na literatura médica internacional no ano de 1982.
Contribuição Social
No Centro Histórico de Salvador, o médico inaugurou na Rua Chile no ano de 1984 o Centro de Pesquisa e Assistência em Reprodução Humana (CEPARH) que se dedica à pesquisas na área da reprodução humana e no planejamento familiar com foco no controle de natalidade tanto masculino como feminino. De acordo com a superintendência da instituição, lá são oferecidos gratuitamente cursos sobre controle de natalidade, além da distribuição de métodos contraceptivos temporários, como pílula, Dispositivo Intrauterino (DIU) e Implante Contraceptivo. Já na área de procedimentos cirúrgicos são ofertadas, mediante atendimento ambulatorial, vasectomias e ligaduras de trompas além do atendimento particular em outras áreas. Nos últimos anos de sua vida, além de presidir o CEPARH, o médico também dirigia há 50 anos a própria clinica que leva o seu nome. Com unidades na capital baiana, e em São Paulo, o médico ainda atendia em Brasília e Rio de Janeiro.
Dentro dos procedimentos desenvolvidos e postos em prática pelo médico estava o uso dos implantes utilizados para diversos fins, inclusive, para a supressão da menstruação. Descoberta na década de 70 pelo cientista, a tese de que a menstruação é nociva e supérflua corrobora para o sucesso dos implantes ainda hoje. Tal constatação foi popularizada no livro intitulado 'Menstruação, a sangria inútil'. “As mulheres podem reproduzir sem menstruar. Menstruação não é uma pré-condição para a gravidez. Obrigatório para engravidar é ovular, e a mulher só precisa ovular quando quer engravidar”, declarou Elsimar em texto divulgado pela assessoria de imprensa.
Vocação
Antes de se formar, Elsimar Coutinho passou a realizar estudos sobre reprodução humana. Através da dosagem de hormônios femininos na urina e no sangue, o cientista chegava à conclusões sobre a saúde das suas pacientes. Neste período, decidiu o caminho que seguiria pesquisando sobre a saúde hormonal dos indivíduos. De acordo com a assessoria de imprensa do médico, ao longo de sua vida, ele publicou 373 artigos em revistas científicas de todo mundo, tendo visitado mais de 43 países para dar cursos, palestras e apresentar suas pesquisas.
Autoridades lamentam a morte do médico Elsimar Coutinho
A notícia do falecimento do médico Elsimar Coutinho repercutiu entre autoridades políticas e entidades médicas do Estado. Na rede social Twitter, o governador Rui Costa escreveu que o Brasil havia perdido um dos seus grandes cientistas, e destacou o papel exercido pelo médico como uma das principais referências em reprodução humana. “Elsimar Coutinho foi antes de tudo um homem inquieto, dedicado ao seu trabalho como médico e pesquisador, levando o nome da Bahia para todo o mundo. Para os pacientes, é a perda de um profissional brilhante e, para família e amigos, a dor da partida de um de um ente querido. Que Deus os conforte nesse momento tão triste para todos nós. Siga em paz, dr. Elsimar!”, twittou. Em outra postagem o governador afirmou “Decreto um dia de luto, nesta terça na Bahia pela morte de Elsimar Coutinho”.
Na mesma rede social, o prefeito ACM Neto rendeu elogios ao trabalho do pesquisador e lamentou seu falecimento. “A Bahia e Brasil perdem um patrimônio, uma inteligência rara, com essa triste partida do professor Elsimar Coutinho, cuja contribuição para a medicina e para a ciência é reconhecida em todo o planeta”, disse completando, “Perdemos um dos grandes nomes da nossa história, uma pessoa que não tinha nenhuma vaidade e que veio ao mundo para servir. Sua dedicação à humanidade o fez publicar centenas de trabalhos científicos em revistas reconhecidas pela comunidade médica internacional".
O presidente da Câmara Municipal de Salvador, Geraldo Júnior ressaltou a perda do cientista. “Fica uma lacuna difícil de ser preenchida pelo ser humano que foi para os amigos e para a família e pelo profissional que levou o nome da Bahia para os quatro cantos do mundo”, disse.
Para o presidente da Academia de Medicina da Bahia (AMB), Antônio Carlos Vieira Lopes, os 27 anos de trabalhos e pesquisas ao lado de Elsimar Coutinho são uma grata lembrança. Elencando os feitos do colega, que também foi seu professor na Faculdade de Medicina da Universidade Federal da Bahia -onde lecionou as disciplinas de bioquímica e fisiologia-, o presidente da AMB ressaltou o fato de Elsimar ter sido elevado a condição de membro emérito da entidade.
Pontuando a importância do cientista enquanto docente, Lopes lembra que Elsimar Coutinho foi o responsável no Brasil pela criação da disciplina de reprodução humana nos cursos de medicina. “Era a inteligência mais brilhante que já conheci na vida. Conheci muita gente inteligente. Mas com o brilhantismo da inteligência de Elsimar talvez tenha sido aquele que melhor tenha visto e convivido. Era um homem sábio, culto, grande amigo, simples e modesto”, pontuou. Em nota, a Associação Baiana de Medicina (ABM) se solidarizou com familiares e amigos do médico.
A Ufba emitiu nota lamentando o falecimento do médico. A instituição lembrou que foi como professor e pesquisador da Faculdade de medicina que Elsimar Coutinho iniciou os seus estudos sobre a progesterona e sua ação na prevenção do trabalho de parto prematuro e descreveu o efeito anticoncepcional da substância.
*Sob supervisão da jornalista Hilcélia Falcão
OBRAS DE ELSIMAR COUTINHO
– Autor das obras O Sexo do Ciúme (1998)
– O Descontrole da Natalidade no Brasil (1998)
– Vivendo sem regras e sem TPM (2007)
– Bahia, menos violência, mais felicidade (2009)
– A Melhor Coisa da Vida (2014)
– Menstruação: a sangria inútil (1999)
Reprodução: A Tarde
da Redação do LD