Brasil

Legista sobre vídeo de Bolsonaro: 'São argumentações de leigos, que nos ofendem'

Responsável por autópsia no corpo do miliciano Adriano Nóbrega descarta, mais uma vez, que tenha havido tortura

NULL
NULL

Responsável pela autópsia no corpo do miliciano Adriano da Nóbrega, morto na Bahia após uma operação policial, o legista Mário Câmara, diretor do Instituto Médico Legal (IML) baiano, criticou o vídeo e as informações divulgadas pelo senador Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ), filho do presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

“Essa história toda, essas filmagens que estão aparecendo, não são técnicas, são argumentações de leigos que nos ofendem bastante”, afirma o legista, para quem, a “autópsia foi bastante simples”.

“O laudo pericial descreve exatamente os orifícios de entrada, os orifícios de saída, a trajetória dos projéteis, a angulação, não há nenhum sinal de tortura no corpo, não há sinal, no corpo, de execução. Há sinais sim, pela angulação dos projéteis, de um confronto com a polícia.”

Na noite da última terça-feira (18), a Justiça da Bahia proibiu a cremação do corpo de Nóbrega e autorizou uma nova autópsia.

O miliciano foi assassinado no dia 9 de fevereiro no município de Esplanada, na Bahia, onde se escondia da polícia. O ex-agente do Bope estava foragido desde janeiro de 2019, quando foi expedido um mandado de prisão contra ele, por diversos crimes, inclusive por integrar milícias e ter participado de um esquema de “rachadinha” no gabinete do então deputado Flávio Bolsonaro.

::Acusado de ligação com milícias, Flávio Bolsonaro é alvo de pedido de cassação::

Para o secretário de Segurança Pública da Bahia, Maurício Barbosa, há intenção de politizar a morte do miliciano. “As imagens não foram feitas nas instalações oficiais do instituto médico legal. Então nós temos a clara convicção de que isso é para trazer algum tipo de dúvida, de questionamento, a um trabalho que ainda não foi concluído. Eu reforço aqui o posicionamento das nossas instituições, a transparência com que estamos agindo e não vamos deixar que, por uma questão política, ou por qualquer outro motivo, qualquer outro interesse que esteja por trás disso tudo, venham trazer qualquer tipo de questionamento prévio, sem antes termos a conclusão da nossa investigação, das nossas perícias, e que o Ministério Público e a Justiça se posicionem quanto a isso.”

Desde a última segunda-feira (17), os treze telefones celulares e sete chips encontrados com Nóbrega, estão com o Grupo de Atuação Especial de Repressão em Crime Organizado (Gaeco) do Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro (MP-RJ). O conteúdo dos eletrônicos passará por uma perícia. A investigação quer saber com quem o miliciano manteve contato durante sua fuga.

O estranho comportamento dos Bolsonaros

Em sua coluna no Brasil de Fato, a jurista Tânia Maria Saraiva de Oliveira, integrante da Coordenação Executiva da Associação Brasileira de Juristas pela Democracia (ABJD), questiona a postura de Jair Bolsonaro e Flávio Bolsonaro no imbróglio envolvendo a morte de Nóbrega.

“No esforço para criar uma versão factível que os afaste das suspeitas sobre a morte do ex-capitão, os Bolsonaros, pai e filho, apostam no esquecimento coletivo de que nunca colocaram em dúvida a palavra de policiais militares em suas ações, nem mesmo as que terminam em morte de civis; que sempre foram defensores da excludente de ilicitude, que autoriza a polícia a matar sem investigação; que defendem a tortura; que são entusiastas da máxima de que ‘bandido bom é bandido morto’”, afirma a jurista.

Ainda de acordo com Oliveira, a intenção da família é modificar a perspectiva da sociedade sobre a relação dos Bolsonaros com as milícias. “Esqueçamos, pois, como eles pensam de fato, porque a questão agora é virar o jogo. É saírem das cordas das suspeitas de estarem envolvidos com a morte de um ex-policial que, assim como Fabiano Queiroz, convivia de perto com a família, e possuía informações que a sociedade não sabe e não saberá. Virar o jogo implica proclamar que a esquerda é quem tem ligação com as milícias, por mais bizarra e estúpida que possa parecer – e seja de fato – a afirmação”, encerra.

Brasil de Fato // Itatiaia Fernandes