Na 56ª fase da Operação Lava Jato, a Polícia Federal prendeu nesta sexta-feira (23) dois ex-presidentes to Petros, fundo de pensão da Petrobras, e pediu a prisão temporária do atual do dono da empreiteira OAS, César Mata Pires Filho.
No total, foram expedidos 22 mandados de prisão por desvios na construção da sede da Petrobras na Bahia. Pires Filho, que era vice-presidente da OAS na época da construção da torre, não foi preso porque está em viagem aos EUA.
O prédio, apelidado de Torre Pituba, foi construído com recursos da Petros com a finalidade de ser alugado pela companhia.
O custo estimado do projeto foi de R$ 1,3 bilhão –dos quais pelo menos R$ 68 milhões foram desviados em pagamento de propina, segundo o Ministério Público Federal.
Os ex-presidentes da Petros presos preventivamente são Luis Carlos Fernandes Afonso e Carlos Fernando Costa. Outro ex-dirigente do fundo de pensão, Newton Carneiro da Cunha, também teve a prisão preventiva decretada.
Um terceiro ex-presidente do fundo, Wagner Pinheiro, foi alvo de buscas, suspeito de ter recebido cerca de R$ 2,5 milhões em vantagens indevidas por meio de uma empresa de fachada. A investigação em relação a ele ainda está em andamento.
Também foi alvo da operação Valdemir Garreta, ex-dirigente petista e responsável pelo marketing de campanhas eleitorais do partido. Ele foi preso temporariamente (com duração de cinco dias), em São Paulo, suspeito de intermediar pagamentos em prol do PT.
É a primeira fase da Lava Jato autorizada pela juíza Gabriela Hardt, que substituiu Sergio Moro na 13ª Vara Federal de Curitiba –e uma das que tem o maior número de presos da operação.
Construída sob medida pela Petros para abrigar os escritórios da Petrobras em Salvador, a Torre Pituba estava orçada inicialmente em R$ 320 milhões. Ao final, só a construção custou cerca de R$ 747 milhões. O projeto final, que incluiu contratos de gerenciamento e projetos executivos, consumiu R$ 1,3 bilhão.
“Era um valor inicialmente palatável, dentro dos percentuais de investimento permitidos pela Petrobras. Mas depois, imediatamente, já incluíram itens”, comentou a procuradora Isabel Vieira Groba, segundo quem o prédio virou “uma obra de grande luxo”, que incluiu heliponto, 2.600 vagas de garagem e 22 elevadores.
A Torre Pituba tem 22 andares, que foram alugados pela Petrobras a partir de 2015, e permanecem como sede da estatal em Salvador. O aluguel mensal gira em torno de R$ 6,5 milhões, segundo o MPF. O contrato com a Petros tem validade de 30 anos, no valor total de R$ 1,4 bilhão.
Segundo a PF, os valores (tanto do aluguel quanto da construção) foram superfaturados “para viabilizar o pagamento de vantagens indevidas para agentes públicos da Petrobras e dirigentes da Petros”.
“Está sobrevalorizado, com certeza”, disse Groba. “Todos os contratos [para construção e gerenciamento da obra] foram precedidos de procedimentos fraudados. A fraude estava instalada dentro da Petros.”
Para os procuradores, isso prejudica a credibilidade e a higidez do fundo.
“É cruel, porque quem é prejudicado são os trabalhadores da Petrobras, é quem depositou toda a esperança de uma velhice tranquila [na Petros] e viu seus valores geridos de forma fraudulenta”, disse a procuradora Laura Tessler.
Os desvios apurados até aqui chegam a R$ 68 milhões, em valores corrigidos, de acordo com o Ministério Público Federal. Isso representa cerca de 10% do valor da obra de construção. É o maior percentual de propinas já identificado na Lava Jato.
Segundo o despacho da juíza, Pires Filho "se envolveu pessoalmente nos contratos fictícios celebrados" pela empreiteira para viabilizar o repasse de valores indevidos. De acordo com a decisão, ele ainda é suspeito de ter autorizado o pagamento de propinas na obra.
O prédio foi construído pelas empreiteiras OAS e Odebrecht —ambas investigadas na Lava Jato. Delações premiadas dos executivos dessas empresas, bem como de dois operadores financeiros (Roberto Trombeta e Rodrigo Morales), ajudaram a fundamentar os pedidos de buscas e prisões. Uma investigação interna da Petrobras sobre o contrato com a Petros também serviu para dar início à apuração.
Pagamentos em dinheiro, por meio de doações eleitorais e em offshores foram identificados pela investigação.
Alguns dos principais operadores do esquema, segundo o MPF, eram os sócios da Mendes Pinto Engenharia, que foi contratada para fazer o gerenciamento da obra da Torre Pituba. A empresa foi criada poucos dias antes do processo de escolha da Petros.
Os empresários Mario Seabra Suarez, Alexandre Andrade Suarez e Marcos Felipe Mendes Pinto estão entre os detidos. De acordo com o MPF, eles se hospedavam em hotéis para fazer os pagamentos aos beneficiários, a maioria em malas de dinheiro.
A cunhada do ex-tesoureiro do PT João Vaccari, Marice Correa de Lima, também foi detida temporariamente. Ela já havia sido detida numa outra fase da Lava Jato, em 2015, mas acabou solta após uma dúvida sobre um vídeo usado para fundamentar sua prisão –quem aparecia sacando dinheiro num caixa eletrônico, segundo a defesa, era a irmã de Marice.
Desta vez, o MPF e a Polícia Federal afirmaram que as provas contra ela são “robustas e bastante significativas”, e incluem elementos documentais e quebras de sigilo telefônico.
A operação desta sexta foi batizada de Sem Fundos, numa alusão ao “saco sem fundos” de crimes investigados na Lava Jato, segundo a PF.
Os mandados estão sendo cumpridos nos estados da Bahia, São Paulo, Rio de Janeiro e Minas Gerais.
Segundo o procurador Roberson Pozzobon, os crimes ocorreram entre 2009 e 2016. São investigados corrupção, lavagem de dinheiro, gestão fraudulenta de fundo de pensão e organização criminosa.
OUTRO LADO
A defesa de Pires Filho diz ter sido pega de surpresa com o pedido de prisão. "Fomos surpreendidos com a decisão judicial que decretou a custódia provisória do nosso cliente", disse o advogado Aloisio Lacerda Medeiros, que defende o dono da OAS. "Estamos ainda nos inteirando dos acontecimentos. Nosso cliente está no exterior e regressará imediatamente ao país para prestar esclarecimentos e acatar a decisão judicial." O advogado não disse quando o empresário voltará ao Brasil.
Danyelle Galvão, advogada de Garreta, diz que a defesa “não teve acesso aos autos, tampouco aos fundamentos da decisão e que já havia se colocado à disposição para prestar esclarecimentos no início deste ano”.
A Folha tenta contato com os outros defensores.
Folhapress // AO