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Acampamento pró-Lula tem noite de balada na véspera de registro de candidatura, diz jornal

Os organizadores não informaram o custo total da marcha, que será dividido, segundo eles, por partidos, sindicatos e movimentos sociais. 

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Erguido numa cidade sem tradição no futebol, o Estádio Mané Garrincha, em Brasília, tem abrigado mais shows e festas eletrônicas do que partidas desde a Copa de 2014. O clima era igualmente de balada na noite desta terça (14), véspera do registro da candidatura do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva à Presidência da República, no acampamento de militantes de esquerda instalado no estacionamento do complexo esportivo.
 
Ao menos quatro mil integrantes de partidos e movimentos sociais aliados do PT se distribuíram sob tendas e barracas. Participam da Marcha Lula Livre, cujo propósito é reivindicar o nome do ex-presidente na urna e sua liberdade. Ao contrário do que sugere a situação, a aura era festiva.

Logo na entrada do estádio, por volta das 20h, os alto-falantes de uma espécie de Kombi-boate, fantasiada com piscas-piscas e adesivos pró-Lula, soavam, na voz de Zé Ramalho, o refrão “bate, bate, bate na porta do céu”.

“Primeiramente, a gente tem de pedir mesmo a Deus. O resto, empurra com a barriga”, comentou, ao ser questionado sobre os desafios de Lula, Antônio Cordeiro Mergulhão, de 65 anos, sem-terra que viajou de Pernambuco a Brasília para apoiar o ex-presidente.

Algumas tendas adiante, a rapper e professora universitária Vera Verônika, filiada ao PT desde 1998, abria evento de mulheres do partido com um pocket show de músicas próprias, cujas letras são de protesto contra mazelas sociais.

Presentes ao ato, as deputadas federais petistas Benedita da Silva (RJ) e Maria do Rosário (RS) fizeram discursos esperançosos sobre Lula e, ao final, dançaram ao som dos jingles de campanhas antigas do ex-presidente.

Formou-se espontaneamente, pouco depois, uma roda de samba.

Por volta das 22h, acenderam-se as luzes de um trio elétrico, que foi palco de apresentações musicais de rap, forró e MPB, programadas até 1h. Os músicos são integrantes do Movimento dos Sem Terra (MST), que levou o maior número de presentes ao acampamento pró-Lula.

Jovens militantes vendiam latas de cerveja a três por R$ 10, gritando ao público ora “Fora, Temer”, ora “Bora, beber”. Um garçom girava o pátio, transformado em pista de dança, a oferecer doses de tequila por R$ 10 e de pinga bananinha por R$ 3.

“Estou aqui pelo Lula, mas fazendo meu dinheiro. Trabalho em todas as baladas de Brasília”, disse o dono da bandeja, Alexandre Pinto de Souza, de 40 anos, explicando que tem simpatia pelo ex-presidente desde os tempos em que ele subia nos palanques de Duque de Caxias (RJ), sua cidade de origem.

No entorno, comprava-se de catuaba a brinquedos; de pastel a roupas femininas; de sanduíches a almofadas num camelódromo que se formou perto de uma carreira de banheiros químicos.

“Vestido longo é R$ 50, para as mulheres desfilarem na passarela”, oferecia, bem humorado, o ambulante Domingos Barbosa, de 52, apesar do desapontamento com as vendas: “Em outros anos, isso aqui era um feirão. Mas é a crise, não é?”.

Mulheres jovens caminhavam apressadas, maquiadas e de salto alto, rumo ao trio, enquanto parte do público, de mais idade, estava aborrecida com o som alto após a caminhada extenuante. “Com esse zoado, como é que dorme?”, questionava na porta de sua barraca Maria de Lurdes Nascimento dos Santos, de 56.

Moradora do acampamento do MST Leonardo Silva, em Ceará-Mirim (RN), ela disse ter viajado a Brasília para que as coisas no país não fiquem “como estão”. “Acho que, com o Lula, vai melhorar. Dos piores, ele foi o melhor, porque nenhum é bom”, afirmou. Ela está acampada há 12 anos, à espera de ser contemplada com um terreno.

Esta é a quarta marcha do MST a Brasília desde 1997 e a primeira cujo mote não é a reforma agrária. As mais de 4.000 pessoas partiram de ônibus dos 26 estados e se encontraram em pontos no entorno do Distrito Federal. Divididas em três colunas, andaram, então, de 50 a 90 quilômetros até o Mané Garrincha.
“Ao todo, levamos  13 dias para chegar. Era gente desmaiando, médico acompanhando, mas a gente conseguiu”, contou Mergulhão. Ele e a mulher estenderam um colchão numa das tendas abertas, bem perto da barulheira.

Segundo os organizadores da marcha, após tanto esforço, a noite de terça era de descontração, principalmente porque não há eventos previstos para a manhã desta quarta (15). Os manifestantes devem seguir para o TSE (Tribunal Superior Eleitoral) só a partir das 14h, quando políticos do PT devem fazer o registro da candidatura de Lula.

“Estamos diante de uma situação anormal. Nunca se viu isso na história do Brasil”, reclamou Ednaldo Batista dos Santos, de 57, responsável pela Kombi-boate estacionada na entrada do estádio.

Dono de uma loja de som em Itabaiana (SE), ele diz ter brigado com a mulher para viajar pelo país com o veículo. Já foi a Curitiba, cidade em que está preso o ex-presidente, e pretende voltar para lá após o compromisso em Brasília. Recentemente, tatuou a estrela do PT no braço.

Com a indefinição sobre a chapa, o vidro traseiro da Kombi faz campanha, ao mesmo tempo, para Lula, Fernando Haddad e Manuela D`ávila. “Esse tríplex tem valor e escritura”, diz o slogan, em referência ao trio de políticos.

Antes dos shows, o evento foi marcado por muitos discursos e cânticos de apoio ao ex-presidente. A senadora Regina Souza (RN), candidata a vice-governadora de seu estado, comparou as situações de Lula e do senador Aécio Neves (PSDB-MG), gravado pedindo R$ 2 milhões ao dono da JBS, Joesley Batista. Por esse episódio, o tucano é réu no Supremo Tribunal Federal por corrupção e obstrução de Justiça. Ele nega ilicitudes.

“Estou doida para ver o TSE dizer que Lula não pode ser candidato. Como é que eles vão explicar para a sociedade brasileira que Lula não pode, mas Aécio pode? Lula não tem gravação, não tem mala de dinheiro. Aécio tem tudo isso”, disse a petista, seguida pela plateia com o cântico “Não tem plano B; primeiro turno, é Lula do PT”.

O evento foi marcado por forte segurança de integrantes do MST, após um ônibus da caravana de Lula ser alvejada por tiros este ano.

Os organizadores não informaram o custo total da marcha, que será dividido, segundo eles, por partidos, sindicatos e movimentos sociais. 

Folhapress // ACJR