O ministro Luiz Edson Fachin, do Supremo Tribunal Federal (STF), autorizou nesta quarta-feira (27) a coleta de provas sobre as delações premiadas de quatro executivos da J&F e afirmou que, após essa fase, a rescisão dos acordos será levada para análise do plenário do tribunal.
Os quatro executivos que podem ter o acordo de delação rescindido são: Joesley Batista, Wesley Batista, Ricardo Saud e Francisco de Assis.
Desde o ano passado há um impasse sobre as delações. Em setembro de 2017, na reta final do mandato, o então procurador-geral da República, Rodrigo Janot, pediu a rescisão das delações por omissão e má-fé dos delatores.
Eles teriam deixado de informar sobre suposta orientação prestada pelo ex-procurador Marcello Miller à J&F nas negociações, enquanto ainda integrava o Ministério Público.
Desde então, defesa e acusação apresentam informações, mas ainda não havia perspectiva de julgamento sobre a validade das delações.
Segundo a determinação de Fachin, os advogados de defesa e a Procuradoria Geral da República (PGR) têm cinco dias para especificar as provas que pretendem produzir e, em caso de depoimento de testemunhas, indicar os nomes e endereços.
"Defiro, nos presentes termos, as diligências solicitadas pela PGR e em respeito aos preceitos constitucionais do contraditório e da ampla defesa, impende determinar a dilação probatória como aqui deferida, e assim que concluída a instrução, colhidas as alegações finais, o feito deve ser de pronto remetido ao Pleno para decisão colegiada sobre a rescisão", afirmou Fachin.
Delação da J&F
O processo das colaborações da J&F tem mais de 2.700 páginas, com 11 volumes e 23 apensos (provas complementares entregues pelos colaboradores, entre outros).
As delações foram fechadas há mais de um ano e validadas por Fachin em maio de 2017. Desde o início os acordos geraram críticas. Opositores à delação da J&F argumentam que foi concedido aos delatores o maior benefício possível, a imunidade penal, ou seja, a impossibilidade de serem denunciados ou responderem a processos na Justiça.
As delações originaram a Operação Patmos, deflagrada em 18 de maio de 2017 para coletar indícios de supostos repasses ilegais da J&F para o senador Aécio Neves (PSDB-MG), que chegou a ser afastado do mandato, e para o presidente Michel Temer. Os dois negam as acusações.
Joesley havia gravado uma conversa com o presidente, na qual, segundo a PGR, eles trataram sobre comprar o silêncio de presos da Lava Jato. Em ação controlada, a Polícia Federal gravou um auxiliar do presidente, o ex-deputado Rodrigo Rocha Loures (MDB-PR), saindo de restaurante com uma mala com R$ 500 mil após recebê-la de Ricardo Saud.
As acusações da J&F viraram denúncia formal da Procuradoria contra Aécio, que se tornou réu em ação penal no STF, e duas denúncias contra Temer, que teve os processos suspensos por decisão da Câmara.
Na decisão de 62 páginas, o ministro Fachin faz um resumo de tudo o que os delatores falaram em seus termos de colaboração.
O ministro afirma que "as graves circunstâncias narradas" pela Procuradoria ao pedir rescisão da delação "devem ser apreciadas e definidas por este Tribunal, impondo sem delongas as sanções e chancela das responsabilidades, se cabíveis".
Segundo o relator da Lava Jato, por "maior escândalo" que um fato pareça ser, é preciso encontrar na Constituição a resposta punitiva. Por isso, ele considerou que é preciso que os 11 ministros do Supremo avaliem a validade da delação.
"Maior escândalo que fato ou acontecimento ofensivo às regras jurídicas, aos postulados éticos e mesmo ao decoro mínimo e às convenções morais de uma sociedade, é violar a própria Constituição na possível resposta sancionadora ou punitiva, o que seria motor de legítima indignação e revolta pela consciência cívico-normativa de um povo cujo Estado se encontra plasmado numa democracia constitucional."
Ele lembra que a decisão por parte do plenário é importante porque, em acordo validado pelo STF, a Procuradoria se comprometeu em não denunciar os delatores, mas o fez mesmo assim posteriormente. Diante da controvérsia, a última palavra é do plenário, afirmou.
"O caso em tela, então, exige manifestação jurisdicional prévia sobre as causas apontadas pelo Ministério Público como suficientes para que se tenha o acordo por rescindido. Tal atribuição se situa na competência do Plenário deste STF."
Por fim, o ministro considerou que determinar coleta de provas para que os delatores possam tentar comprovar que não cometeram ilegalidades atende "princípios da ampla defesa e contraditório".
G1 // AO